Estudando o Espiritismo

Observe os links ao lado. Eles podem ter artigos com o mesmo tema que você está pesquisando.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Espiritismo e Ciência

Jorge Cordeiro

O que é uma Ciência?

A visão clássica da Ciência assume que uma disciplina é uma ciência quando adota um método específico chamado de método científico. Um ramo da Filosofia denominado de Filosofia da Ciência trata da explicação, compreensão e elaboração do método científico. De acordo com esta visão, uma ciência é criada a partir de um longo processo de coleta de informações, através da observação de fenômenos (ou objetos) a serem estudados. As informações colhidas dariam origem a leis, e a junção de várias leis formariam as teorias científicas que seriam responsáveis por explicar os fenômenos observados e prever novos acontecimentos. O ápice desta visão ocorreu durante as décadas de 20 e 40 do século passado e ficou conhecido como positivismo lógico. Ao longo das décadas seguintes, questões importantes foram levantadas contra esta concepção filosófica, fazendo-se restrições variadas. Dentre estes críticos destacam-se Karl Popper, Thomas Kuhn, Imre Lakatos, Paul Feyrabend e Willard Quine. Uma visão mais atual da Filosofia da Ciência, não compartilhada ainda por todos os cientistas, define que na atividade científica, a observação dos fatos e as teorias desenvolvem-se juntas numa ampla experimentação de hipóteses, apoiadas numa ampla discussão em torno de novos fatos, e ao contrário do que defendia o positivismo, as teorias poderiam ser de caráter metafísico, sendo mais importantes a capacidade destas teorias de explicarem os fenômenos adequadamente, fazer previsões empíricas e ter a virtude da simplicidade e abrangência. Resumidamente: uma ciência completa possui um núcleo teórico principal formado por leis fundamentais, um grupo de hipóteses auxiliares que servem de conexão com o grupo de fatos. Eventuais discordâncias entre a teoria e os fatos, seriam resolvidas por ajustes nas hipóteses auxiliares.
O Método Espírita

Kardec presenciou os fenômenos das mesas girantes, e por ter uma personalidade curiosa e investigativa, tomou para si um propósito de explicar o que estava acontecendo. Kardec tinha uma profunda base científica e filosófica, e usando destas resolveu se debruçar sobre estes fenômenos, como o astrônomo que diante das estrelas procura conhecer os seus segredos. A princípio cético e sem nenhuma pressuposição, passou a freqüentar mais assiduamente às sessões mediúnicas, cujo desenrolar e conteúdo logo o levaram a aprofundar sua pesquisa. Com seu espírito observador, passou a aplicar o método da observação experimental nos fenômenos que se manifestavam. Ele estudou as mensagens transmitidas pelos médiuns tão friamente e racionalmente, como estudou os próprios médiuns, avaliando seu linguajar, sua educação ou sua cultura geral, e concluiu que eles não poderiam de forma alguma tecer comentários tão profundos e superiores como das pessoas mais sábias que pisaram o planeta, ou tão banais e simplórios como de qualquer pessoa sem estudo, muito aquém do nível destes médiuns. Algumas mensagens eram de conhecimento muito íntimo de pessoas já falecidas, que de nenhuma forma eram do conhecimento geral, e outras muito racionais para uma personalidade poética, ou muito poética para uma personalidade prática. Ouviu explicações variadas de temas importantes, como Deus, o homem, a natureza ou o sentido da vida. Não tinha outra explicação plausível: os mortos se manifestavam por esses médiuns e toda uma nova filosofia nascia, toda uma nova série de fenômenos se apresentava, era chegado o momento de revelar ao mundo a doutrina dos espíritos. Ele acreditava na manifestação dos espíritos pela profundidade e pela lógica do que se discutia e se apresentava, não pela manifestação em si, ou pelas mudanças apresentadas pelos médiuns, seja na voz ou na postura ou por algum efeito físico concomitante como materializações ou levitação de objetos. A beleza, a simplicidade, a coerência e a unidade de visão do que os espíritos falavam era que tornava convincente esta realidade.
Ele usou o que hoje se poderia nomear na filosofia fenomenológica de redução eidética. Ele fez múltiplas perguntas a vários médiuns diferentes e de vários níveis de cultura, e coletou uma série de respostas sobre os mais diversos temas. Destas respostas ele procurou uma unidade, procurou retirar o que era imutável, retirar a sua essência e disto surgiu o que representava o pensamento dos espíritos de escol para a humanidade, e nos foi dada a Ciência dos Espíritos.
O Espiritismo como Ciência

Vimos portanto que o método empregado por Kardec para a fundamentação da Doutrina Espírita foi o método da observação experimental e se ajusta perfeitamente ao que se faz em ciência para descobrir as leis que regem os fenômenos investigados. A partir dos dados coletados e avaliados, Kardec provou a existência do espírito, que é a sua essência, o seu Eu que sobrevive à morte e que é a sede das emoções e do pensamento, pois esse Eu retornara do túmulo e através da mediunidade “de efeitos intelectuais”, apresentava uma personalidade que era reconhecida por amigos, parentes, conhecidos ou por uma avaliação da cultura que apresentava, por suas idéias particulares ou sua moral. Era como uma impressão digital insubstituível, uma característica que era própria ou uma lembrança que era particularmente sua. E estas características ou lembranças servem para comprovar a identidade de uma pessoa, como também a sobrevivência desta pessoa à morte, como tantas vezes se apresentou na história do Espiritismo. Não se pode dizer que a Ciência Espírita, seja uma ciência tradicional nos moldes da Biologia, da Química ou da Física. Não temos para apresentar ao mundo o peso de um espírito, ou sua composição química, ou um molde de seus órgãos internos, pois o Espiritismo não é do domínio da ciência tradicional, mas é uma ciência por seu método científico de investigação e uma Filosofia moral por suas implicações. Como disse Kardec (1857/2003):
“As ciências ordinárias repousam sobre as propriedades da matéria que se pode experimentar e manipular à vontade; os fenômenos espíritas repousam sobre a ação de inteligências que têm a sua própria vontade e nos provam a cada instante que elas não estão à disposição dos nossos caprichos. As observações, portanto, não podem ser feitas da mesma maneira; elas requerem condições especiais e um outro ponto de partida; querer submetê-las aos nossos processos ordinários de investigação, é estabelecer analogias que não existem. A Ciência, propriamente dita, como ciência, portanto, é incompetente para se pronunciar na questão do Espiritismo: não tem que se ocupar com isso e seu julgamento, qualquer que seja, favorável ou não, não poderia ter nenhuma importância. (p. 23-4)
Donde se conclui que o Espiritismo não necessita da Ciência Materialista ou de seus cientistas, pois nem a Ciência nada tem a oferecer ao Espiritismo em sua fundamentação nem os cientistas podem explicar os fenômenos espíritas mais coerentemente que seus estudiosos. Não devemos pois incorrer no erro dos grupos de estudos que surgiram após a doutrina espírita como a Metapsíquica de Charles Richet, a Sociedade de Pesquisas Psíquicas inglesa ou americana ou a própria Parapsicologia que tenta estudar entre outras coisas a existência do espírito ou a sobrevivência do mesmo à morte, usando de fundamentos positivistas (o que é uma incoerência, pois o positivismo exclui a metafísica).
Nas palavras de Aécio P. Chagas (1995):
Muitos estudiosos têm se envolvido numa determinada linha de pesquisa, que remonta à época das mesas girantes, e que tem por objetivo provar a existência do Espírito através de métodos físicos. Apesar de não estar só, em minha obscura opinião, esta linha não chegou e nem chegará a nada, pois os métodos físicos são adequados para estudar a matéria (foram feitos para isto). Caso alguém evidencie a presença do Espírito através de um método físico, cabe sempre um questionamento metodológico, e daí não se chega a parte alguma. Por outro lado, muitos confrades poderiam ainda argumentar com o fato de Kardec, em suas obras, mencionar várias vezes que o Espiritismo e a Ciência marchariam lado a lado. Estas afirmações poderiam causar (e causam) em muitos leitores a impressão de que Kardec falava das ciências da matéria. Creio que Kardec tinha em mente a Ciência Espírita, que ele acreditava com toda a certeza, que ainda estava no começo e que iria crescer...”
A este respeito também comenta Sílvio S. Chibeni (1988):
“... é preciso cautela no entendimento da progressividade do Espiritismo...ela deve ocorrer...sem recurso a elementos estranhos, venham de onde vierem, sob o risco de este perder sua consistência...a harmonia com as conquistas da Ciência não deve ser buscada irrestritamente e a qualquer preço, visto estar ela, em suas proposições abstratas, constantemente sujeita a enganos e retificações...aparentemente, os que em nossos dias advogam a tese do ”ajuste à Ciência” ainda não se deram conta desse fato, nem perceberam que...em A Gênese, Kardec deixou clara uma ressalva, ao falar desse ajuste...”
A passagem comentada por Chibeni em “A Gênese” de Kardec (1868/2002) é a seguinte:
O Espiritismo não coloca, pois, como princípio absoluto, senão o que está demonstrado como evidência, ou que ressalta logicamente da observação. Tocando em todos os ramos da economia social, às quais presta o apoio de suas próprias descobertas, assimilará sempre todas as doutrinas progressivas , de qualquer ordem que sejam, chegadas ao estado de verdades práticas, e saídas do domínio da utopia; sem isso se suicidaria; cessando de ser o que é, mentiria à sua origem e ao seu fim providencial” (p. 40).
Como vimos, o Espiritismo e a Ciência Positivista são de domínios diferentes, e portanto, estudos que visam desvendar características materiais, usando aparelhos para captar manifestações que são intimamente de outra ordem, são esforços desperdiçados e de pouca utilidade pois a existência do espírito para o espírita já é uma realidade objetiva nas mesas mediúnicas. Quando na verdade, deveríamos estar aumentando nosso conhecimento sobre a mediunidade e seu desenvolvimento, o plano espiritual, as conseqüências de nossos atos, ou melhorando-nos moral e eticamente, pois a finalidade da vida revelada pelos espíritos é o aperfeiçoamento da alma e a eliminação de nossas deficiências, desenvolvendo um espírito de caridade e amor por nossos semelhantes.
Jorge Cordeiro
Notas:
[1] – “A Redução Eidética (em grego, éidos significa essência ou idéia, no sentido platônico) é o momento em que a consciência deve tornar-se capaz de perceber que, para além da coisa, com o seu conjunto de dados sensíveis ou psíquicos, há um sentido nela latente. O sujeito do conhecimento deve tornar-se capaz de perceber esse sentido para além da coisa. É preciso perceber que as aparências encobrem o sentido que deve ser desvelado. Nesse momento, a consciência torna-se segura de que há um "interior", uma essência, para além das aparências”. Em: http://www.filosofiaclinica-ce.com.br/rotas/fernaocapelo.html# (Rota 003 - Viagem pela Fenomenologia - Fenomenologia: Informações Elementares, em 15/11/2003)
Fontes:
Chagas, Aécio Pereira (1987). As provas científicas. Artigo publicado em Reformadoragosto de 1987, pp. 232-33.
__________________ (1995). A Ciência confirma o Espiritismo? Artigo publicado em Reformadorjulho de 1995, pp. 208-11.
Chibeni, Silvio Seno (1988). A excelência metodológica do Espiritismo. Artigo publicado em Reformadornovembro de 1988, pp. 328-33 edezembro de 1988, pp.373-78.
_________________ (1991). Ciência espírita. Artigo publicado na Revista Internacional de Espiritismomarço de 1991, pp. 45-52.
_________________ (1994). O paradigma espírita. Artigo publicado em Reformadorjunho de 1994.
_________________ (2003). O Espiritismo em seu tríplice aspecto: científico, filosófico e religioso. Texto elaborado para o XII Congresso Estadual de Espiritismo (USE) – Tema 4.10 Campinas, 17 a 20/04/2003.
Guiot, Alain e Gisèle (1999). A verdade revelada por Allan Kardec – a atualidade do ensinamento kardecista. São Paulo: Madras.
Kardec, Allan (1857/2003). O livro dos espíritos. Araras, SP: IDE.
__________ (1868/2002). A gênese. Araras, SP: IDE.

Nenhum comentário:

Postar um comentário