Em 1853, a Europa inteira tinha as atenções gerais convergidas para o fenômeno das chamadas “mesas girantes e dançantes”, considerado “o maior acontecimento do século” pelo Reverendíssimo Padre Ventura de Raulica, então o mais ilustre representante da teologia e da filosofia católicas. Em toda palestra havia sempre uma referência às mesas fantásticas: “table volante” ou “table tournante”, para os franceses; “table-Moving”, para os ingleses; “tischrueken” para os alemães.
A imprensa informava e tecia largos comentários acerca das estranhas manifestações, e a não ser o grande físico inglês Faraday, o sábio químico Chevreul, o Conde Gasparin, o Marquês de Mirville, o abade Moigno, Arago, Babinet e alguns outros eminentes homens de ciência, bem poucos se importavam em descobrir-lhes as causas, em explica-las, a maioria dos acadêmicos olhando os fenômenos com superioridade e desdém.
Um articulista da época transcrevia em “História da Semana”, no periódico “Ilustration”, (14 de maio de 1853), a interessante crônica do famoso crítico e literato francês Julio Janin:
“Toda a Europa(que digo eu, a Europa?), neste momento o mundo inteiro tem o espírito voltado para uma experiência que consiste em fazer girar uma mesa. Só se ouve falar, por toda parte, da mesa que gira; o próprio Galileu fez menos ruído no dia em que ele provou ser realmente a Terra quem girava em torno do Sol. Ide por aqui, ide por ali, nos grandes salões, nas mais humildes mansardas, no atelier do pintor, em Londres, Paris, em Nova York, em São Petersburgo – e vereis pessoas gravemente assentadas em torno de uma mesa vazia, que eles contemplam à semelhança daqueles crentes que passam a vida a olhar seus umbigos! Oh! A mesa! Ela fez tábua rasa dos nossos prazeres de todas as tardes”.
Em Paris de 1853, principalmente, a recreação mais palpitante e mais original era a das “mesas girantes”, havendo uma preferência quase que absoluta pelas mesas feitas de acaju.
Desenhos da época pintam os salões da alta aristocracia parisiense com a sua nota característica: senhores respeitáveis, senhoras e senhoritas elegantes, reuniam-se em torno de mesas redondas, espalmando as mãos um pouco acima delas(formava-se uma corrente pelo contato de todos os dedos mínimos), com o intuito de faze-las movimentar; outro grupo tentava obter o movimento de uma bola suspensa por um fio; outro, um pouco distante, usava uma cesta munida de um lápis, sobre a qual uma dama coquette colocava a mão adornada de brilhantes, na esperança de conseguir algum rabisco numa ardósia; além, respeitável senhor de cavanhaque procurava movimentar uma cartola, sem toca-la, é lógico. Nos mais diferentes locais, eram as experiências da moda. A conversa, tantos nos elegantes boulevards quanto nos faubourgs mais humildes, discorria invariavelmente acerca das mesas falantes e da guerra da Rússia contra a Turquia.
Os fenômenos constituíam para a generalidade dos assistentes um passatempo como qualquer outro. Quase ninguém se aprofundava no estudo da causa de tais manifestações extraordinárias. As vezes surgia uma que outra pretensiosa explicação, que logo era desprezada por não poder satisfazer aos fatos observados. Por esta época, o grande físico inglês Faraday, embora afirmasse a sua convicção na realidade das mesas girantes, expôs, no jornal inglês “Athenaeum”, uma teoria tendenciosa, a que, entretanto, não se deu a importância que parecia desejar.
O importante semanário parisiense “Ilustration”, de 25 de junho de 1853, informava então que uma única pessoa não se achava nada satisfeita com tudo isso: a Academia, que ainda – acrescentava com certo ar de pouca esperança – está a pesquisar as causas ocultas desse fenômeno de “mesas girantes”. Livros que tratavam dessas mesas começaram a aparecer, atraindo leitores aos milhares, citando-se, entre os autores, Roubard, Gasparin, Mirville e outros.
Em 24 de dezembro de 1853, Ilustration” registrava a seguinte nota: “Depois que um eclesiástico, correspondente de “L. Unives”, descobriu Satã, em pessoa, numa mesa de três pés, as “mesas falantes” adquiriram uma fama sinistra que lhes valeu serem postas formalmente no Index por dois de nossos prelados, os Reverendos Bispos de Orleães e de Viviers”.
Mas as mesas continuaram...Veio o Santo Ofício e, em 4 de agosto de 1856, condenou os fenômenos em voga, dizendo serem conseqüência de hipnotismo e magnetismo (já que pouca gente acreditava em peripécias do diabo), e tachavam de hereges as pessoas por intermédio das quais eles eram produzidos.
Z.Wantuil e F.Thiessen
Da obra “Allan Kardec” – Vol.2 pg. 56
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