"Acerca da meditação"

Elzio Ferreira de Souza

Livro: Espaço, Tempo e Causalidade (2003)

Editora: Circulus

Capítulo 10



ACERCA DA MEDITAÇÃO


As pessoas estão sempre em busca de um método com o qual possam meditar. O mestre sempre se mostrou refratário a indicar métodos de meditação. E sempre que alguém o abordava a respeito, dizia: “Pensa no Divino, coloca Deus em tua vida. Em toda a tua vida, e não só em parte dela” - acrescentava, “e estarás meditando”. Certo dia, o discípulo questionou-o a respeito, dizendo-lhe que algumas pessoas o procuraram, buscando a indicação de um método que pudesse servir de guia para meditação de iniciantes, e o mestre disse:

- Não sei se as pessoas que procuram um método desejam realmente meditar ou relaxar. O relaxamento é sempre fácil, porque se pode consegui-lo em determinados momentos e até através da auto-hipnose, mas a meditação é bem outra coisa, não é para determinadas horas do dia, é para o dia todo.

- Mas, senhor, existe o momento em que nos retiramos para meditação individual ou em grupo - disse o discípulo.

- Não há dúvida quanto a isso, mas não basta.

- Mas elas desejam começar - insistiu.

- Está bem. É necessário inicialmente aprenderem a ficar sentadas. Se não se pode ficar imóvel durante cinco minutos sem estar com o pensamento especulando ou com o desejo que os minutos passem, como aprender a meditar? Então, em primeiro lugar, aprendam a ficar quinze a vinte minutos sem fazer alguma coisa. Sem ouvir música: ouvir música não é meditação. A música pode auxiliar a aquietar a mente. Mas audição musical não é meditação. Nesta, a música nunca é externa, é interna, você não vai ouvir sons exteriores, a coisa toda se passa por dentro do meditador, e não fora.

- Sim, todavia as pessoas sentem dificuldades.

- Meditação não é para quem relaciona dificuldades, mas para os que buscam o Divino. Veja o modo como Jesus se referiu à persecução de objetivos: pede, procura, bate, e a porta se abrirá; se o indivíduo permanecer em silêncio durante quinze minutos, se insistir durante certo tempo sem titubear, sem querer alcançar isto ou aquilo, a coisa acontecerá, ele entrará em meditação, e os passos poderão ser demarcados. Sem uma providência inicial, não adianta dizer - “faça isto ou aquilo”, porque ele executará durante uns dias e, como não obterá resposta imediata, estará, em breve, à procura de um método mais eficaz. As pessoas que não gostam de andar a pé querem veículos cada vez mais rápidos, como alguém que desejasse, para ir de uma rua a outra ou de um bairro a outro, um foguete supersônico. Desprezam andar e querem voar. Os desastres neste terreno se dão facilmente, porque não faltam “gurus” que lhes prometam tudo em cursos regulares nos quais esvaziam os bolsos dos clientes.

O discípulo ficou em silêncio por um instante e depois disse:

- No entanto, há sempre uma parcela de pessoas desejosas de iniciar uma vida espiritual.

- Não há dúvida, mas o desejo não é o bastante. Alguém vê uma torta na vitrine e de uma casa de doces e anseia provar a iguaria. Não pode quebrar a vitrine e apoderar-se dela; terá que primeiro trabalhar, obter o dinheiro necessário e depois comprá-la. Ainda com sua posse, não pode saboreá-la de uma vez, pois pode ter problemas sérios de estômago, intestino, etc. É possível, no entanto, conservá-la no refrigerador e ir apreciando-a aos poucos. A meditação verdadeira não é produto de um assalto, mas uma conquista decorrente da disciplina e do amor. Disciplina mais amor é igual a meditação. Isto não é tarefa para alguns instantes, mas de uma vida - concluiu o mestre.





Comentários:

Este texto parece compreender uma síntese do pensamento de Yogashririshnam, no sentido de que é mais importante colocar Deus em todos os atos de nossas vidas do que procurar por técnicas de meditação. Porém, sem desmerecer a importância da oração e da meditação, o autor aponta a forma inicial pela qual pode ser praticada na busca do silêncio interior.