Elzio Ferreira de Souza
Livro: Divina Presença: comentários mediúnicos a João da Cruz (1992)
Editora: Circulus
Capítulo 8
A MAIOR ORAÇÃO
“... nem já tenho outro ofício que já só amar é meu exercício.”
Cântico Espiritual - XXVIII
João da Cruz
Sabe você que a oração é a nossa mensagem na comunicação com Deus; através dela estabelecemos uma ponte de ligação pela qual nos tornamos aptos a receber dos céus o auxílio para prosseguir na execução dos deveres com a correção esperada. Isto faz parte da existência física e das denominadas vidas espirituais. No entanto, nem toda oração é realmente oração.
Você percebe que um veículo de comunicação pode ter utilização variada e que cada um é responsável pelo conteúdo da mensagem que emite. Existem rogativas e declarações de diversas espécies, invocações variadas, nas quais o indivíduo busca mais prazer na insanidade de que se acomete, através da busca de sexo, de dinheiro, de conforto ou de poder. Os pedidos se multiplicam, e Deus é visto como um grande mágico a produzir bens para o deleite de cada um. Pedintaria não é oração.
A oração é mais disposição do espírito que palavras. É possível que para o iniciante em sua arte haja necessidade de emitir até os sons como meio de manter-se atento e evitar a dispersão. A pouco e pouco, porém, acalmada e treinada a atenção, o ser se encerra em oração mental, silenciosa, em que a criatura vai declarando ao Senhor o seu amor, o desejo de entrega, fazendo seus votos de fidelidade, ou exercitando-se em refletir sobre um episódio da vida mestra de Jesus ou de outro lumiar da espiritualidade na qual a manifestação divina tenha se feito patente, ou fixando-se numa palavra. Não é senão com o tempo que o silêncio definitivo aparece, sem premeditação, sem desejos ou imposições da vontade, e o ser se cala também interiormente - o silêncio se torna oração. No silêncio, o silêncio de Deus se comunica ao silêncio do homem.
Não pense, entretanto, que Deus somente se comunica quando você se mantém retirado e apartado de todos. Um Deus presente não pode estar apenas no cume da montanha, no interior da floresta, no cenáculo dos templos ou no quarto de um lar. Ele está sempre aí, à sua disposição. Não há ser mais disponível que Deus.
Isso lhe deve fazer refletir sobre os modelos distintos pelos quais a mesma oração pode apresentar-se a seu coração. Quando você aprender a estar com o Senhor, onde quer que você esteja, o que quer que você faça, nada o tirará da sua presença, porque o seu próprio agir se transformará em comunicação com o Divino. Quando você cumpre seus deveres com correção atuando segundo a lei; quando o faz sem manchas de orgulho ou intenção outra senão cumprir com sua quota de serviço para a humanidade; quando espera a aprovação de ninguém senão de Deus; quando seu trabalho passa a ser um oferenda ao Divino, então esteja certo de que a oração transformou-se em seu único exercício.
Da intimidade de seu quarto à choupana do pobre, Deus o acompanhará em comunicação silenciosa. Mantenho-o consigo; cerque-o e não o permita fugir. O Amado pode muita vez examinar a sua fidelidade, deixando-o em secura interior; pode parecer muito distante e você estará privado de qualquer comunicação espiritual. Não desespere, esforece-se mais, ame ainda mais, trabalhe mais em favor dos que sofrem, porque o Senhor não pode deixar de encontra-se ali, embora se esconda. O que parece noite escura e desesperadora é o prelúdio do amanhecer. Não se renda ao cansaço, nem se entregue ao desespero; Deus não nos abandona, nunca nos deixa sozinhos. O amor verdadeiro não conhece ausências.
Se você perseverar, o Amado acabará rendendo-se, porque ele também não pode ficar sem enviar-lhe notícias; ele anseia por dizer à alma fiel que a ama e não pode esquecê-la. Exercite-se no amor. No exercício do amor ao próximo, você conhecerá a maior oração.
Comentários:
O autor trata do tema da oração e, a certa altura, aparenta adentrar o tópico da meditação, como uma continuação ou culminância do processo da oração. É interessante como parece haver um link com algumas mensagens de Joanna de Ângelis, em que o processo reflexivo não é abandonado de início, mas, atingindo-se o silêncio naturalmente, conseguem-se resultados positivos no campo do autoconhecimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário