Estudando o Espiritismo

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segunda-feira, 23 de agosto de 2010

A) Síntese do Momento Cultural na Europa, à Época da Codificação


Para muitos historiadores, o século XIX, caracterizado por inúmeras conquistas científicas, é também chamado o século das grandes transformações, em função das lutas renovadoras no âmbito social e político em que a Europa mergulhou, notadamente a França. O desejo de liberdade impulsionou as conquistas sociais, de um lado sob a tutela dos princípios democráticos pregados pelos pensadores do século, e de outro, ainda sob os efeitos da Revolução Francesa e da Era Napoleônica. As idéias liberais, resquício dessa Revolução, foram assimiladas, tais como a igualdade de todos perante a lei, e a liberdade de pensamento e de cultos; em consequência, houve o desabrochar da responsabilidade individual, num preparo prévio para a conscientização da Humanidade no seu novo papel, frente ao progresso que se desenrolava sob seus olhos.

O momento político e cultural da Europa, à época da Codificação foi decisivo para a história da Humanidade, pois as grandes invenções e descobertas científicas agitavam todos os ramos do conhecimento, destacando-se:
— Ampere, André-Marie (1775 / 1836) — físico francês, um dos, pioneiros no estabelecimento de teorias matemáticas sobre as relações | entre eletricidade e magnetismo;
— Lavoisier, Antoine-Laurent (1773 / 1794) — pioneiro no estabelecimento dos princípios e fundamentos da química;

— Pasteur, Louis
 (1822 / 1895) — químico e biologista francês tornou-se célebre no mundo científico por seus trabalhos sobre cristalografia, fermentações, higiene, agentes propagadores das infecções, vacina contra o carbúnculo, raiva, e principalmente pelo chamado processo de pasteurização.

— Mesmer, Franz Anton
 (17347 1815) — médico alemão que realizou pesquisas sobre as propriedades dos imãs, dos fluidos e do magnetismo animal . Segundo a teoria de Mesmer (mesmerismo), todo ser vivo possui um fluido magnético que estabelece influências recíprocas entre os indivíduos.

— Pestalozzi, J. Heinrich
 (1746 / 1827) — pedagogo suíço que preconizou o estudo especializado; teorizou a educação fundamental, partindo da criança para o ensino e não vice-versa; foi discípulo de Jean Jaques Rousseau; fundou a escola-lar para crianças em várias cidades da Suíça, entre estas Yverdon, onde Allan Kardec estudou e lecionou pedagogia.

Os cientistas sustentavam que sua função não era acreditar e sim, investigar; por esta razão, a Ciência estava continuamente em constante progresso, deixando de lado as velhas teorias incapazes de explicar os fatos. Em função desta postura, todos os campos do saber humano registraram descobertas, invenções e sistemas, estabelecendo idéias fundamentais, acumulando conhecimentos em todas as áreas. A Filosofia também se rendeu a essa onda renovadora,embora materialista, que caracterizou o século XIX; temos assim como representantes desse momento:

— Descartes, René (1596 / 1650) — Considerado o pai da Filosofia moderna, afirmava que para conhecermos a verdade, é preciso, de início, partir da dúvida, questionando tudo criteriosamente. Fazendo uma aplicação metódica da dúvida, o filósofo foi considerando como incerta a percepção sensorial e as noções adquiridas sobre os objetos materiais. Estabeleceu que a única verdade totalmente livre de dúvidas era a seguinte: meus pensamentos existem. Ao chegar à célebre conclusão "Penso, logo existo", afirma assim que pensamento é algo mais certo que a matéria corporal, e descobre a realidade inegável do Espírito. Pode-se dizer que a chamada revolução cartesiana foi precursora da revolução espírita.

— Kant, Immanuel 
(1724 71804) — Sua vida foi inteiramente consagrada ao estudo, ao ensino e à meditação. Preocupou-se em estabelecer quais os limites e o alcance da razão, enquanto faculdade de conhecimento. Escreveu: A Religião nos Limites da Razão Pura, a Crítica da Razão Pura, a Crítica da Razão Prática, onde demonstra que a lei moral é a possibilidade a mais profunda de nosso ser, e a realização de nossa verdadeira destinação.

— Hegel, George W. Friedrich
 (1770 71831) — Suas primeiras reflexões referem-se ao espírito do Judaísmo e do Cristianismo, e testemunham preocupações religiosas e históricas; o que lhe interessava era descobrir o espírito de uma religião ou de um povo em seu contexto histórico. Escreveu, assim, a Fenomenologia do Espírito, onde traça a história pela qual a consciência humana elevou-se das representações mais elementares de Deus à sua representação filosófica adequada.

Surgiu assim o Iluminismo, pois suas concepções filosóficas baseadas no uso e exaltação da razão encontravam respaldo nos pensadores da época. Por volta de 1848, toda a Europa é agitada pela Revolução Liberal e Democrática, desencadeando uma série de tumultos populares. Em conseqüência,os valores éticos tradicionais perderam a sustentação; não houve novos valores morais que pudessem substituir os antigos. As religiões, a quem caberiam o papel de preencher o vazio transcendental que se instalara entre os homens, recolheram-se nos seus objetivos; como resultado, a crença se desmoronou com a decadência da fé e as diversas religiões mostraram-se incapazes de reavivar a luz espiritual.

O progresso moral da Humanidade, estagnado, distanciou-se cada vez mais do progresso cientifico e uma grande depressão se abateu em todos os setores da comunidade europeia que, pela primeira vez, desiludiu-se ante as grandes conquistas alcançadas no campo da Ciência, que não satisfaziam seus anseios espirituais. Em meio a esse contexto, um fato inusitado veio à tona, exatamente em Paris, fulcro pensante do século XIX, agitando teólogos, cientistas, filósofos e demais estudiosos: a 18 de abril de 1857, Allan Kardec, o futuro Codificador de uma doutrina que iria preencher o vazio existencial da Humanidade, publicou O Livro dos Espíritos. Muito embora toda a Europa já estivesse familiarizada com os fenômenos espíritas, principalmente através do fenômeno das mesas girantes, tais fatos não passavam de meros divertimentos nos salões sociais.
Mas agora eles adquiriam uma outra conotação, pois o impacto causado por Allan Kardec, que assumia publicamente a direção do movimento espírita, provocou reações no mundo todo. Sobre estes fatos, assim Kardec se expressou: Compreendi, antes de tudo, a gravidade da pesquisa que ia empreender; percebi naqueles fenômenos a chave do problema tão obscuro e tão controvertido do passado e do futuro da Humanidade, a solução que eu procurara em toda a minha vida. Em suma, toda uma revolução nas idéias e nas crenças (Obras Póstumas, segunda parte, Cap. "Minha Primeira Iniciação no Espiritismo").

A nova doutrina que despontava no horizonte do século XIX vinha exatamente na hora psicológica mais apropriada, justamente no torvelinho das grandes transformações para reabilitar, de acordo com as orientações vindas dos Espíritos, o papel do homem frente ao seu destino imortal; seus valores, centrados no Evangelho de Cristo, mostravam à Humanidade o caminho do progresso espiritual, ao mesmo tempo em que trazia o consolo e a esperança que os homens tanto almejavam. A tarefa de Allan Kardec era difícil e complexa. Competia-lhe reorganizar o edifício desmoronado da crença, reconduzindo a civilização às suas profundas bases religiosas, diz André Luiz em A Caminho da Luz ( Cap. XXIII).

Por isso o Espiritismo, enquanto Consolador prometido por Jesus, só pode ser revelado aos homens no contexto científico do século XIX, em meio a matemáticos, astrônomos, botânicos, filósofos e físicos que fizeram a Ciência de seu tempo. Era preciso que assim fosse, para que a Humanidade pudesse apreender as leis naturais que regem o Universo, reveladas pelo Espiritismo. Observando,comparando e julgando os fatos, sempre com cuidado e perseverança,concluiu (Kardec), que realmente eram os Espíritos daqueles que morreram a causa inteligente dos efeitos inteligentes e deduziu as leis que regem esses fenômenos, deles extraindo admiráveis consequências filosóficas e toda uma doutrina de esperança, de consolações e de solidariedade universal. O homem pôde então conhecer as leis naturais e suas implicações, pôde descrever as leis que regem os mais diversos fenômenos, estabelecendo novas fronteiras do conhecimento.

Allan Kardec, Espírito missionário encarregado de ser o portador desta nova Revelação, fora preparado para ser o elemento unificador do pensamento deste século, pois unia seu rigoroso método científico ao submeter os fenômenos espíritas à luz da razão, à integridade e pureza do seu coração; ele era a síntese da razão e da fé, assim como a doutrina que ele trazia a público era a síntese da ciência, da filosofia e da religião, e isto era tudo o que faltava para preencher o vazio existencial da Humanidade.

Bibliografia:
Obras Póstumas - Ed. FEESP, Allan Kardec
Grandes Espíritas do Brasil - Ed. FEB, Wantuil, Zeus
Allan Kardec, Vol. II - Zeus Wantuil e Francisco Thiesen, Ed. FEB
A Gênese, Cap. I e XVII - Allan Kardec
Evolução em Dois Mundos - André Luiz, psicografia de Francisco Cândido Xavier,Ed.FEB 

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