O Espiritismo e a legalização do aborto
Sabemos bem dos problemas que a prática causa, tanto à mãe quanto à criança abortada. E quanto a sermos radicalmente contrários a essa prática, não há dúvidas quanto ao acerto de nossa posição. Assim como não há dúvidas de que devemos fazer campanha permanente contra o aborto. Porém, é preciso ampliar nosso raio de visão e nossa capacidade de observar as coisas de uma forma mais ampla.
Qual deve ser nossa posição quanto à legalidade, ou não, do aborto? Trata-se de uma discussão bem diversa daquela acima. Trata-se de refletir sobre os limites aos quais a lei do homem não deve transpor. Até que ponto a lei do homem deve proibir que uma mulher se negue a ser mãe? Até que ponto deve a lei do homem interferir no livre-arbítrio dessa mulher? Embora seja nosso papel alertar sobre as conseqüências desse ato, será nosso direito impedi-lo pela força da lei?
É preciso lembrar que a proibição do aborto não impede sua ocorrência. Inclusive, da forma em que a coisa se dá, da forma que nos organizamos, o Estado, esse sujeito coletivo que somos todos nós, comete, em proibindo o aborto, outros crimes diante de Deus. É público e notório que as mulheres que decidem por abortar, não recuam em sua decisão, pelo fato de lhes ser negado atendimento hospitalar. Farão da forma que for possível, independente da lei.
É aí que entra uma questão de ordem social das mais importantes. As mulheres de classe alta sequer tomam conhecimento da lei. Procuram clínicas — e existem muitas — que lhes fazem todo o procedimento, com toda a higiene e segurança a um preço elevado, que apenas estas mulheres de classe alta poderiam pagar.
Já as mulheres pobres, de vida dura e economicamente torturadas por esse sistema excludente em que vivemos, são, como de costume, jogadas à própria sorte. Elas também não deixarão de abortar, como a mulher de classe alta, mas são as únicas que são, realmente penalizadas pela lei. Estas mulheres miseráveis farão o aborto com procedimentos de alto risco, como por exemplo, introduzindo cabides retorcidos em seu ventre.
O aborto, através desses "procedimentos alternativos", buscados por mulheres sem alternativas financeiras é a terceira maior causa de morte de mulheres em São Paulo. Já na Bahia, nada mata mais mulheres do que ele.
Como espírita, reputo o aborto como prática terrível contra a qual devemos lutar. Mas, é também como espírita que vejo a necessidade de que as mulheres que optarem pelo aborto sejam assistidas com todo o carinho e cuidado pelo Estado.
Ao proibir o aborto, não estamos lutando contra ele, mas sim, cometendo o crime de omissão para com as mulheres pobres desse país. E essa omissão será debitada na nossa "conta coletiva".
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