Escrito por Jayme Lobato
A casa espírita vinha passando por uma fase difícil. O dirigente da desobsessão, alegando divergências com a Diretoria, se desligara do centro. Geraldo, presidente do centro, por falta de opção, indicou Paulo para a direção da sessão de socorro aos desencarnados. Após dois meses na função, e porque detinha alguma experiência e conhecimento doutrinário, Paulo procura Geraldo para expor suas preocupações:
- A reunião de desobsessão vai muito mal, Geraldo! O ambiente, desgastado por descontentamentos, não consegue sustentar o equilíbrio necessário a manifestações coerentes.
E Paulo enfatiza:
- O trabalho está, a meu ver, muito vulnerável!
- É falta de Evangelho, Paulo! Nossos médiuns precisam se evangelizar!
- Isso não é tão simples assim, Geraldo! A conquista de valores morais, conforme proposto por Jesus, é tarefa de todos nós! E não especificamente dos médiuns da desobsessão!
E Paulo acrescenta:
- Acho que as dificuldades que estão ocorrendo na desobsessão vêm acarretando sérios prejuízos para o próprio centro, de uma forma geral.
O presidente assevera:
- Confio nos Mentores de nossa Casa! Eles não falharão conosco!
- Mas, Geraldo! Eu acho que é de responsabilidade nossa a busca de solução para os problemas humanos que surjam no centro. Os Espíritos benfeitores nos ajudarão se cumprimos com a nossa parte!
- Quando um elemento está trazendo constrangimento para a casa espírita, os Mentores acham, logo, um meio de desvinculá-lo do centro!
- Você acredita mesmo nisso, Geraldo!
- Acredito sim! Veja o caso do antigo responsável pela desobsessão! Por tantas dificuldades criadas, viu-se premido a deixar a casa.
- Conversei com ele sobre o assunto! Disse-me que se desligou do centro por discordar da postura da diretoria, que não admite seja feita avaliação do trabalho de desobsessão.
E Geraldo se defende:
- É conversa dele! O caso é outro!
- Soube também que ele queria instituir, para o grupo da desobsessão, estudo sério sobre mediunidade, com base em O Livro dos Médiuns, de Kardec - o que foi vetado pela própria diretoria.
E Paulo, ansioso, ainda comenta:
- Preocupa-me a falta de transparência no relacionamento entre os companheiros, não só da desobsessão como de todo o nosso centro!
- Não vou me indispor com os companheiros do centro, Paulo! A caridade em primeiro lugar!
- Não desejo ser rude, Geraldo, mas não posso me omitir nesse momento tão difícil do centro, em que está em jogo sua credibilidade como instituição espírita.
- Mas, por que você diz isso?! Nossa casa é séria!
Paulo, diante da responsabilidade que assumira, afirma:
- O ambiente da desobsessão está um caos em termos de entrosamento entre os trabalhadores. Cada um tem comportamento próprio. Não há unidade de postura, por falta de esclarecimento, por falta de estudo.
- Lá vem você também como essa lenga-lenga de estudo! Os companheiros que trabalham na desobsessão já estão lá há alguns anos. Têm bastante experiência no assunto!
- Contudo, Geraldo, o que presencio é um grupo de pessoas, sem conhecimento algum de mediunidade, em que cada um quer tratar do assunto a seu modo.
Geraldo, um tanto constrangido, até porque não havia outro para coordenar o trabalho, pigarreia e fala:
- Mas, Paulo, não podemos contrariar pessoas antigas no centro! Pessoas que deram o suor para que essa casa pudesse existir! Onde a caridade?!
- Acho que você está certo num ponto! Não podemos faltar com a caridade!
- Pois então, Paulo!? Que solução adotar?!
- Acho, Geraldo, que a maior caridade que você pode praticar com relação aos integrantes do centro é abri-lhes possibilidades de estudo!
- Não bastam as palestras das reuniões públicas?!
- Não bastam não, meu amigo! Aqui ninguém conhece as obras básicas do Espiritismo! Se estão errando por ignorância, a quem responsabilizar por seus erros?!
Geraldo, percebendo a argumentação lógica, incisiva e honesta do companheiro, como também reconhecendo que o centro não ia bem, resolve falar franco com Paulo:
- A questão é que nem eu conheço as obras de Allan Kardec! Como vou querer que os outros as conheçam!
E Paulo, percebendo a delicada posição do presidente, propõe:
- Nunca é tarde para aprender, meu caro Geraldo! Nunca é tarde!
- Mas ... Vai ficar muito constrangedor começar aprender agora o que já devia saber! Afinal, sou o presidente desta casa.
- A meu ver, seria uma prova de humildade e um exemplo para os outros!
Como resultado da conversa transparente e fraterna entre os dois, Geraldo abre seu coração para o companheiro:
- Andava até um pouco deprimido, Paulo ! Reconhecia que a falta de esclarecimento estava prejudicando a nossa casa espírita, mas não tinha coragem de enfrentar a situação, já que eu mesmo não me esclarecera.
- Se você concordar, poderemos, juntos, elaborar um programa de estudo sistemático das obras de Allan Kardec, para todos os componentes da instituição.
- Seria uma aula por semana, não é isso?
- Não se trata de aula, Geraldo! Proponho um estudo em grupo, conforme orientação de Kardec, no item 347, de O Livro dos Médiuns.
E Paulo, querendo animar o presidente, acrescenta:
- O codificador nesse item, de O Livro dos Médiuns, fala que, da discussão dos temas, a que cada um dá a contribuição das suas próprias reflexões, saem os esclarecimentos que passam despercebidos numa leitura individual.
- Quer dizer que não haverá professor de Espiritismo?
- Não, Geraldo! Nós todos estudaremos, juntos, a Doutrina Espírita!
- Estou animado com sua proposta. Vamos colocá-la em prática!
- Devo previni-lo, presidente, de que encontrará resistência por parte dos que acham desnecessário o estudo!
- Venci a minha própria resistência! Eles também saberão vencer as suas!
A resistência, por parte de alguns, não desanimou Geraldo. Logo ele sentiu o resultado do estudo em si próprio: estava mais seguro na direção da casa espírita. E o centro, vencidos os obstáculos iniciais, seguiu seu rumo certo ao atender à recomendação do Espírito de Verdade: Espiritas! amai-vos, este o primeiro ensinamento; instruí-vos, este o segundo.
Boletim de Abril/2003
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