Estudando o Espiritismo

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segunda-feira, 18 de março de 2013

A serviço do Self - Adenáuer Novaes


“Acautelai-vos dos falsos profetas que se vos apresentam disfarçados em ovelhas, mas por dentro são lobos roubadores.” Mateus 7:15.

Os falsos cristos são aqueles que, embora divulguem a mensagem cristã, não se propõem conscientemente a vivenciá-la, usando-a para fins pessoais e visando a obtenção do poder. Pregam falsas doutrinas em nome do Cristo, de acordo com seus próprios interesses. São comerciantes da fé e aproveitadores da credulidade alheia. Usam a religião para servir como alternativa a seus propósitos inconfessáveis e, por vezes, inconscientes.

O alerta do Cristo pode também ser tomado em sentido psicológico na medida que entendamos como referentes às armadilhas psíquicas em que nós mesmos caímos por não conhecermos devidamente o funcionamento da psiquê humana. Esse desconhecimento é decorrente da ignorância que ainda temos do próprio psiquismo humano, considerando-o ingenuamente como produto da química cerebral. Na medida que o ser humano evolui espiritualmente, ele melhor utiliza seus recursos psíquicos.

Essas armadilhas psíquicas são os mecanismos de defesa de que nos utilizamos face à incapacidade de lidar com a realidade externa quando esta entra em confronto com a interna. Nem sempre suportamos o peso da culpa, do remorso, da falta, do ódio, etc., preferindo a utilização de bengalas psíquicas para compensar o peso do inconsciente.

Os falsos ‘cristos’ são as falsas verdades que adotamos, não só aquelas que nos parecem verdadeiras, portanto não nos damos conta de sua nocividade, como também aquelas que, deliberadamente, adotamos como certas, mesmo sabendo dos prejuízos delas decorrentes. Também nos trazem prejuízos, semelhantes aos falsos cristos, as atitudes que tendem a nos trazer a falsa sensação de felicidade, sem o necessário esforço para conquistá-la.

São mecanismos de defesas, ou bengalas psíquicas, típicos, atuando psiquicamente em nós como falsos cristos:

a) quando transferimos para o mundo externo as responsabilidades que nos competem, adjetivando as pessoas com nossas próprias características não percebidas;
b) quando nos atribuímos qualidades superlativas, pertencentes a pessoas as quais admiramos;
c) quando voltamos a um comportamento antigo que já não mais necessitávamos adotar;
d) quando ampliamos uma qualidade ou defeito de alguém para outras pessoas que com ele convivem;
e) quando reprimimos um comportamento por uma proibição sem a necessária consciência de seus efeitos;
f) quando manifestamos fisicamente emoções não trabalhadas eficazmente;
g) quando nos distanciamos dos problemas por fuga ou medo de enfrentá-los;
h) quando nos achamos impotentes para sair de determinadas situações críticas;
i) quando buscamos justificativas simplistas para atitudes equivocadas ou frustrações não percebidas;
j) quando adotamos um comportamento diametralmente oposto ao que não sabemos aceitar e entender em nós ou nos outros.

Os mecanismos que nos afastam do necessário enfrentamento com nossa realidade interna, cuja percepção só é, em última análise, privilégio de Deus, se tornam fortemente arraigados em nossa personalidade, a ponto de permanecermos incontáveis encarnações sem nos darmos conta de sua consistência e imanência em nós. Eles se tornam parte de nossa personalidade e só deixam de influenciá-la na medida que buscamos investir num processo de autodescoberta e autotransformação.

O principal falso cristo se apresenta na medida que damos mais atenção aos apelos do ego e suas exigências de poder, em detrimento da valorização do Self, instrumento de ordenação e organização do Espírito. Devemos viver a serviço do Self e não do ego. Isto significa entender que, quando me refiro ao eu, deveria imaginar a individualidade eterna, isto é, o Espírito, e não apenas o eu encarnado, envolvido pelas contingências culturais e circunstanciais.

Não seguir os falsos cristos é assumir o comando de sua própria encarnação, sem prosseguir imitando os outros. Nem o próprio Cristo deve ser imitado, pois cada um deve seguir sua própria vida e carregar a própria cruz. Sua mensagem deve ser seguida, mas sua vida não deve ser imitada, isto é, não se deve copiar os costumes e hábitos de sua cultura e época. Devemos seguir nossas próprias tendências positivas sem imitarmos os outros. A imitação é sempre cópia e arremedo da verdade. Vivenciar e incorporar a mensagem não é imitar seu autor.

Cada um de nós, para não seguirmos um falso sentido da mensagem, deve descobrir a própria singularidade de que somos constituídos. O que é bom para os outros nem sempre o é para mim. Devo seguir meu destino com meus próprios pés. Soa falso acreditar que o caminho da verdade é como uma linha de montagem de uma fábrica. A mensagem é única, porém a forma de vivenciá-la é distinta para cada ser humano.

Os falsos cristos dentro de nós são as velhas concepções arcaicas a respeito da vida e do futuro, onde se considerava a vida como produto da biologia do organismo físico, onde a velha crença de que a morte é o fim, domina a vida consciente, impedindo a manifestação da individualidade eterna, o Espírito imortal. O predomínio, na consciência, de que a Vida se apaga com a morte do corpo tornou-se um algoz para o Espírito. Talvez este seja o principal falso cristo do ser humano.

Há outros falsos cristos que se incorporam, sem pedir licença, à nossa personalidade e que, muitas vezes, se tornam tão autônomos que parecem se confundir com ela. São o que Jung chama de personas, ou máscaras sociais. São formas de relacionar-se com o mundo que podem gozar de certa autonomia e que, se o ego se identificar muito com elas, podem tomar seu lugar. Necessitamos, ao longo da encarnação, nos desvestir dessas máscaras que, muitas vezes, vêm se estruturando e dominando a personalidade, por várias encarnações. Nem sempre é possível, tal o grau de identidade entre o ego e a persona, desvestir-se dela ou mesmo percebê-la. Um exemplo muito claro é quando, por adotarmos uma mesma profissão por várias encarnações, acabamos por não conseguir deixar de pensar e agir pelos modos típicos daquela profissão.

Desvestir-se das personas, equivale a aprender a fazer diferença entre a atitude externa, face às exigências do meio, e a personalidade integral, essência interna e divina, Espírito imortal. Desvestir-se é aprender a usar sem se permitir ser tomado por elas. É utilizar na medida em que o meio o exija.

Seguir o verdadeiro Cristo é descobrir a tendência divina contida na estrutura do Self, onde repousam  as leis de Deus, como balizadores do destino do ser humano. Ao Espírito só chegam as leis de Deus e elas se consolidam nas tendências do Self

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