Em clara manhã de primavera encontraram-se, na mesma via, a Vaidade, o Evangelho e o Discípulo.
Disse a Vaidade: “Vem comigo; goza a vida, és jovem.”
Esclareceu o Evangelho: “Renuncia a ti mesmo, vem, e segue o Mestre!” O Discípulo ouviu e calou.
Disse a Vaidade: “Tens saúde; aproveita os dias e, enquanto as forças te permitem, desfralda o banquete do prazer.”
Esclareceu o Evangelho: “Aquele que pega da charrua e olha para trás não é digno do Senhor!”
O Discípulo entristeceu-se e continuou calado.
Disse a Vaidade: “Odeia os que te prejudicam e retribui o amor aqueles que te amam e serás feliz no mundo.”
Esclareceu o Evangelho: “Perdoar, não apenas sete vezes, mas, setenta vezes sete, para ser digno da vida.”
O Discípulo, entristecido e calado, perturbou-se.
Disse a Vaidade: “Bebe e vive, repousa e levanta-te para mais gozar. A mocidade é rápida e a morte logo vem. Aproveita!”
Esclareceu o Evangelho: “Deixai que venham a mim os jovens, pois que deles é o reino dos céus!”
O Discípulo, atônito, recuou alguns passos e, inquieto, se pôs a chorar.
Disse a Vaidade: “Aproveita o ensejo que passa, reúne dinheiro, armazena para o futuro e usa teus bens na conquista do prazer. é tudo quanto se leva da vida.”
Esclareceu o Evangelho: “Louco! Ainda esta noite te tomarão a alma. Que te valem as posses?”
E o Discípulo, traumatizado, dobrou-se, tombando ao solo, em convulsões.
Disse a Vaidade: ‘Levanta-te e esmaga o mundo aos teus pés. A vida é dos fortes e ousados; avança, resolutamente e sem receio. O triunfo te aguarda.”
Esclareceu o Evangelho: ‘E da forma que medires, julgares e agires, assim também serás medido, julgado e condenado.”
O Discípulo, tomado pelo pavor do conflito íntimo, teve um delíquio. Levantando-se, depois, olhou o adornado corpo da vaidade, o fulgor das suas jóias e enrubesceu entusiasmado. Ao lado, o Evangelho, de lirial brancura, vestia-se com a simplicidade da pureza.
E o Discípulo, atormentado, febril e inquieto, disse à Vaidade: “Seguirei contigo; sofro muito; ainda é tempo; preciso viver; procurarei servir a Cristo e amar o mundo.” Abraçando-se à Vaidade, partiu precipitadamente.
É certo que triunfou. Guardou o corpo em tecidos caros, defendeu os pés das asperezas do caminho com calçados resistentes e macios, adereçou os dedos e os braços com jóias reluzentes, deixando que algumas migalhas da mesa farta chegassem às esfaimadas bocas dos pobrezinhos.
Mas, quando veio a velhice, a Vaidade fugiu, temerosa. O Discípulo, atormentado, foi atrás dela, nas vascas de loucura cruel.
E o Evangelho, que nunca o abandonara, seguiu-o, ainda, e a meio do caminho convidou-o amorosamente: “Vem a mim, tu que estás cansado e aflito, e eu te aliviarei.”
Pe. Natividade (por Divaldo Franco)
Reformador(FEB) , pág. 176 08.1960
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