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Estudando o Espiritismo
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segunda-feira, 22 de abril de 2013
Estranha Moral
Estranha Moral
Sérgio Biagi Gregório
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Conceito. 3. O Problema do Significado das Palavras. 4. Odiar Pai e Mãe: 4.1. O Texto Evangélico; 4.2. O Significado da Palavra Odiar; 4.3. Deixar Pai e Mãe. 5. Deixar os Mortos Enterrar os Mortos: 5.1. O Texto Evangélico; 5.2. O significado de Deixar os Mortos Enterrar os Mortos; 5.3. Acorda e Ajuda. 6. Não Vim Trazer a Paz, mas a Divisão: 6.1. O Texto Evangélico; 6.2. O Significado de Paz e de Espada; 6.3. A Interpretação Simbólica da Paz e da Espada. 7. Conclusão. 8. Bibliografia Consultada.
1. INTRODUÇÃO
O objetivo deste estudo é refletir sobre algumas frases evangélicas, tais como, “odiar pai e mãe”, “deixar os mortos enterrar os mortos”, que causam estranheza e desconforto aos nossos olhos e ouvidos.
2. CONCEITO
Moral - Da raiz latina mores = costumes, conduta, comportamento, modo de agir. É o conjunto sistemático de normas que orientam o homem para a realização do seu fim (essência).
A moral é a regra da boa conduta e, portanto, da distinção entre o bem e o mal. Funda-se na observação da lei de Deus. O homem se conduz bem quando faz tudo tendo em vista o bem e para o bem de todos, porque então tende a Deus. (Pergunta 629 de O Livro dos Espíritos)
Estranho. De o verbo estranhar, achar extraordinário, oposto aos costumes, ao hábito. Achar diferente do que seria natural esperar-se. Fora do comum, desusado, anormal. Misterioso, enigmático.
3. O PROBLEMA DO SIGNIFICADO DAS PALAVRAS
Etimologia – ciência que investiga as origens próximas e remotas das palavras e sua evolução histórica – e semântica – estudo das mudanças que no espaço e no tempo, experimenta a significação das palavras consideradas como sinais das idéias – são os dois termos que usamos para apreender o real significado de uma palavra.
As contradições nos debates são muitas vezes fruto das diferentes interpretações que a mesma palavra oferece. Nesse sentido, Sócrates, filósofo grego da Antigüidade, orientava-nos para bem definir o termo antes de começarmos a discutir. Adquirindo o hábito de enunciar a terminologia correta, pouparemos o tempo que o grupo gasta na compreensão do seu significado.
Exemplos: 1) a palavra Philosophia, com ph, difere substancialmente da mesma palavra escrita sem o ph. A philosophia dos gregos que, enquanto palavra grega, é um caminho, caminho sobre o qual estamos a caminho. Quer dizer, há sempre uma procura renovada do arche, da ratio, do ti estin. Sem o ph pode significar simplesmente uma maneira de viver. 2) Na época de Sócrates, falava-se do daimon (Espírito protetor); hoje, entendido como demônio.
Com relação à doutrina evangélica, especifiquemos duas dificuldades: 1.ª) os apóstolos escreveram os Evangelhos muito tempo depois da morte de Cristo; 2.ª) os problemas de tradução de uma língua para outra.
Em vista do exposto, convém nos valermos das orientações dadas pelos Espíritos benfeitores, a fim de lançarmos um pouco de luz nas trevas de nossa ignorância.
4. ODIAR PAI E MÃE
4.1. O TEXTO EVANGÉLICO
“Se alguém vem a mim, e não odeia seu pai e sua mãe, sua mulher e seus filhos, seus irmãos e suas irmãs, e mesmo sua própria vida, não pode ser meu discípulo. E todo aquele que não carrega sua cruz e não me segue, não pode ser meu discípulo. Assim, todo aquele que dentre vós não renuncia a tudo o que tem, não pode ser meu discípulo”. (Lucas, 14, 25 a 27 e 33)
“Aquele que ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim, não é digno de mim; aquele que ama seu filho ou sua filha mais do que a mim não é digno de mim”. (Mateus, 10, 37)
4.2. O SIGNIFICADO DA PALAVRA ODIAR
Non odit em latim, kai ou misei em grego, não quer dizer odiar mas amar menos. O que exprime o verbo grego misein, o verbo hebreu, do qual deve ter se servido Jesus, o diz ainda melhor; não significa somente odiar, mas amar menos, não amar tanto quanto, igual a um outro. No dialeto siríaco, do qual se diz que Jesus usava mais freqüentemente, essa significação é ainda mais acentuada. A palavra odiar se refere, portanto, ao sentido de ódio como o entendemos na atualidade. E mesmo que quiséssemos traduzir por odiar, iríamos de encontro ao caráter e a personalidade de Jesus. De duas uma: ou a palavra foi escrita de forma indevida, ou a tradução não pode captar o seu verdadeiro significado. De qualquer forma, tomá-la como amar menos faz mais sentido e dá uma conotação mais racional ao nosso modo de pensar.
4.3. DEIXAR PAI E MÃE
Quando Jesus nos chama para o seu apostolado e pede-nos para deixarmos pai e mãe, isso não significa que devemos abandoná-los ao sabor da sorte, o que implicaria em falta de caridade, virtude constantemente pregada por Ele mesmo. O que se depreende daí é que devemos nos preocupar com a vida futura, a vida religiosa. Esta tem para nós mais importância do que os nossos parentes e amigos. Quantas não são as pessoas que não podem freqüentar uma religião porque um dos seus familiares não o permite? Quantas pessoas não vão às escondidas ao um Centro Espírita? E por que não proclamam abertamente a sua religião? Simplesmente para não perturbar o ambiente doméstico.
O Espírito Emmanuel nos alerta: “renunciar por amor ao Cristo é perder as esperanças da Terra, conquistando as do Céu”. Ele nos diz: “Se os pais são incompreensíveis, se a companheira é ingrata, se os irmãos parecem cruéis, é preciso renunciar à alegria de tê-los melhores ou perfeitos, a fim de trabalhar no aperfeiçoamento com Jesus. Acaso, não encontras compreensão no lar? Os amigos e irmão são indiferentes e rudes? Permanece ao lado deles, mesmo assim, esperando para mais tarde o júbilo de encontrar os que se afinam perfeitamente contigo”. (Xavier, 1973, cap. 154)
5. DEIXAR OS MORTOS ENTERRAR OS MORTOS
5.1. O TEXTO EVANGÉLICO
“Ele disse a um outro: Segui-me; e ele lhe respondeu: Senhor, permiti-me ir antes enterrar meu pai. Jesus lhe respondeu: Deixai aos mortos o cuidado de enterrar seus mortos, mas por vós ide anunciar o reino de Deus”. (Lucas, 9, 59 e 60)
5.2. O SIGNIFICADO DE DEIXAR OS MORTOS ENTERRAR OS MORTOS
Nas circunstâncias em que foram ditas, essas palavras não exprimem uma censura àquele que considera um dever de piedade filial ir enterrar o seu pai; elas encerram um sentido mais profundo, um sentido espiritual.
“A vida espiritual, com efeito, é a verdadeira vida; é a vida normal do Espírito; sua existência terrestre não é senão transitória e passageira; é uma espécie de morte comparada ao esplendor e à atividade da vida espiritual. O corpo não é senão uma veste grosseira que reveste momentaneamente o Espírito, verdadeira cadeia que o prende à gleba da Terra, e da qual se sente feliz de estar livre. O respeito que se tem pelos mortos não se prende à matéria, mas, pela lembrança, ao Espírito ausente; é análogo àquele que se tem pelos objetos que lhe pertenceram, que tocou, e que aqueles que o amam guardam como relíquias”. (Kardec, 1984, p. 277)
5.3. ACORDA E AJUDA
O Espírito Emmanuel, comentando o texto evangélico, diz-nos que Jesus não recomendou ao aprendiz deixasse “aos cadáveres o cuidado de enterrar os cadáveres”, e sim conferisse “aos mortos o cuidado de enterrar os seus mortos”. Há, em verdade, grande diferença. O cadáver é carne sem vida, enquanto um morto é alguém que se ausenta da vida. Nesta lição ele fala dos trânsfugas da evolução, dos que mergulham em sepulcros de ouro, de vício, de amargura e de ilusão, os verdadeiros mortos para os atributos da evolução espiritual. Conclui dizendo: “se encontrares algum cadáver, dá-lhe a bênção da sepultura, na relação das tuas obras de caridade, mas, em se tratando da jornada espiritual, deixa sempre “aos mortos o cuidado de enterrar os seus mortos””. (Xavier, s.d.p., cap. 143)
6. NÃO VIM TRAZER A PAZ, MAS A DIVISÃO
6.1. O TEXTO EVANGÉLICO
A paz e a espada representam um ensinamento transmitido por Jesus. Mateus, no cap. X, vv. 34 a 36, narra essa passagem evangélica nos seguintes termos: "Não penseis que eu vim trazer paz sobre a Terra; eu não vim trazer a paz, mas a espada; porque eu vim separar o homem de seu pai, a filha de sua mãe e a nora de sua sogra; e o homem terá por inimigos os de sua casa". Lucas, no cap. XII, vv. 49 a 53, trata do mesmo assunto, acrescentando que Jesus viera lançar fogo sobre a Terra e tinha pressa que ele se acendesse.
6.2. O SIGNIFICADO DE PAZ E DE ESPADA
Paz - do lat. pax, pacis - é a tranqüilidade da ordem. É a aspiração fundamental de cada homem e de toda a humanidade, a ponto de seu conceito quase ser confundido com o de felicidade. Espada - do gr. spáthe, pelo lat. spatha - é a arma branca, formada de uma lâmina comprida e pontiaguda, de um ou dois gumes. Símbolo do Estado Militar e de sua virtude. Relacionada com a balança, significa justiça: separa o bem do mal, julga o culpado.
6.3. A INTERPRETAÇÃO SIMBÓLICA DA PAZ E DA ESPADA
O ensinamento da paz e da espada, como tantos outros ensinamentos trazidos por Jesus, possui conteúdo alegórico. A interpretação do referido trecho varia de seita para seita. A espada do Cristo, que era de fraternidade, passa a ser instrumento de violência e opressão nas mãos dos propagadores de determinadas seitas. Os próprios cristãos, de perseguidos, passam a ser perseguidores. Não é, pois, de se estranhar que as guerras religiosas destruíram mais do que as guerras políticas.
Toda a idéia nova gera oposição. Eis a correta interpretação dessa passagem evangélica. O "novo", quando fundamentado na lógica e na razão, fere interesses pessoais. Isso acontece na Ciência, na Filosofia e, também, na Religião. Por isso a importância da nova idéia é proporcional à resistência encontrada. Pois, se julgada sem conseqüência, deixá-la-iam passar, mas, como sentem-se ameaçados, fazem de tudo para dificultar a sua propagação.
O Espiritismo, à semelhança do Socratismo e do Cristianismo, traz um novo paradigma para a humanidade, e pode ser interpretado como uma nova espada. Não será aceita sem lutas, controvérsias e oposições. Sua pujança não está nas disputas sangrentas, mas na modificação interior que proporciona a cada um de seus adeptos. A questão da espada será muito mais uma guerra de cada um contra si mesmo e contra todo o mal, fazendo com que possamos ser "promotores da paz".
7. CONCLUSÃO
Nesta reflexão percebemos que o termo odiar que dizer amar menos e deixar pai e mãe não é lançá-los à própria sorte, mas adquirir condições de aceitá-los tais quais são como gostaríamos que nos aceitassem como somos.
8. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
KARDEC, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 39. ed. São Paulo: IDE, 1984.
KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. 8. ed. São Paulo: Feesp, 1995.
XAVIER, F. C. Fonte Viva, pelo Espírito Emmanuel. Rio de Janeiro: FEB, [s.d.p.]
XAVIER, F. C. Caminho, Verdade e Vida, pelo Espírito Emmanuel. 6. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1973.
São Paulo, 12/05/2004
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