Estudando o Espiritismo

Observe os links ao lado. Eles podem ter artigos com o mesmo tema que você está pesquisando.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Espiritismo por Dentro


“A benevolência para com os seus semelhantes, fruto do amor ao próximo, produz a afabilidade e a doçura, que lhe são as formas de manifestar-se. Entretanto, nem sempre há que fiar nas aparências. A educação e a freqüentação do mundo podem dar ao homem o verniz dessas qualidades. Quantos há cuja fingida bonomia não passa de máscara para o exterior, de uma roupagem cujo talhe primoroso dissimula as deformidades interiores!
O mundo está cheio dessas criaturas que têm nos lábios o sorriso e no coração o veneno; que são brandas, desde que nada as agaste, mas que mordem a menor contrariedade; cuja língua, de outro quando falam pela frente, se muda em dardo peçonhento, quando estão por detrás.” Lázaro, (Paris, 1861) O Evangelho Segundo Espiritismo – Cap. IX – Item 6

O casal Andrade e seus filhos eram integrantes ativos de organização doutrinária que patrocinava um grande evento espírita naquela pequena cidade. O explanador da ocasião havia sido recebido naquele lar com muita gentileza por parte de seus anfitriões. Durante o almoço, o marido esmerava-se me gestos e posturas de cordialidade buscando atender convenientemente o visitante, no entanto, sua esposa mantinha-se taciturna, com um olhar de revolta. O orador, porque era médium de faculdades educadas, aguçou suas antenas psíquicas na verificação do que passava com Dona Anastácia, captando intensa dor e tristeza nos sentimentos da sua anfitriã.

O evento realizou-se durante a tarde e parte da noite. No retorno ao lar, novamente a cena instalava-se à hora do repasto noturno, sendo que desta feita a esposa conturbada sai aos prantos da mesa, em crise inesperada. O palestrante, preocupado com o ocorrido, indaga ao esposo se algo poderia fazer e recebe queixas e deboches insensíveis do marido. Resolve então por solicitar um diálogo com Anastácia e ela, sem pestanejar, desabafou dizendo: “eu gostaria que meu marido tratasse-me com um centésimo da finura com a qual ele tem tratado o senhor como nosso visitante!”
...............................................
“Espiritismo de aparências”. “Espiritismo de superfície”.
A assimilação das propostas éticas da doutrina seguem uma seqüência natural e paulatina de maturidade. Primeiro atinge as idéias, posteriormente penetra os sentimentos e, por fim, renova as atitudes. Evidentemente, não será possível estipular uma separação perceptível entre essas etapas, porque elas se complementam e interagem sem que haja uma nitidez sobre seus efeitos. Na pequena historieta acima nota-se que o esposo de Dona Anastácia apresentava uma fachada para os que estão de fora do lar, mas na intimidade era um homem rude com sua companheira. Durante um estágio do processo de renovação espiritual essa conduta, inevitavelmente, fará parte do contexto do aperfeiçoamento. O incômodo decorrente dessa situação levará ao aprendiz da espiritualização a buscar uma coerência entre suas forças interiores na aquisição de sua própria paz. Todavia, se o aprendiz não se devotar o suficiente poderá permanecer demasiadamente no “Espiritismo de adorno”...

Pensamento, sentimento e ação são vivências que a princípio se contrapõem nessa escala do crescimento moral. Pensa-se algo, sente-se diversamente e age-se em dissonância com ambos. Uma desarmonia existe entre as três potências da alma. O esclarecimento espírita atinge o campo do pensar permitindo que a reflexão conduza o homem a novas formas de entendimento e avaliação da sua existência, no entanto, a transformação do sentir e os cuidados com as atitudes são os verdadeiros indicadores de que essa informação intelectiva está sofrendo uma metamorfose na intimidade, através do acionamento da vontade e do esforço na mudança de hábitos e reações perante os fatos da vida.

Espíritas que se aplicam na reforma interior não são identificados por suas ações no campo das aparências, que podem não passar de verniz ou máscara para dissimilar suas imperfeições e impressionar com qualidades que não adquiriu, mas são reconhecidos por suas reações aos testes de cada hora onde estiver. A forma de reagir a uma ofensa, a uma perda, a uma traição aferem a qualidade das mudanças que realmente temos operado no sentimento e se temos o Espiritismo de aparências ou por dentro. Como diz Lázaro: “(...) são brandas, desde que nada as agaste, mas que mordem à menor contrariedade”, isso é uma reação.

As poses religiosas sempre fizeram parte das atitudes humanas no intuito de convencer o outro daquilo que não convencemos a nós próprios. Essa atitude é reflexo do orgulho em querer parecer o que ainda não somos para fruir das sensações de que estamos sendo admirados e prezados pelos outros. Além de orgulho, é também escassez de auto-estima, é a mendicância da consideração alheia apresentando “falsos dotes” para chamar a atenção e conquistar o apreço. Genuflexões, voz mansa, abraços calorosos, sorrisos de alegria são bons modos que podem, algumas vezes, esconder propósitos falsos ou interesses escusos de prestígio. Essa “santidade de superfície” pode ser considerada natural nos primeiros tempos do contato com as Revelações Novas na vida da criatura até que ela se ajuste a uma conduta que melhor expresse a sua realidade. Mas para aqueles que passam os anos detendo-se nesses “chavões de puritanismo”, podem estar sofrendo de “negação psicológica”, ou seja, a manutenção de algum mecanismo de defesa que impeça  de analisar-se com sinceridade e construir a autoaceitação. O orgulho, como doença da alma, é habilidoso o bastante para gerar uma “capa de ofuscamento” das nossas imperfeições e criar uma “miragem encantadora”, com virtudes que ainda não desenvolvemos, nas quais ele nos faz acreditar. Até certo ponto é uma forma natural de se proteger da angústia e da aflição provocadas pelo autoconhecimento que produz o esclarecimento espírita, angústia decorrente do contato com a nossa inferioridade. E muito doloroso reconhecer nossa verdadeira condição espiritual...

Aprender a sermos nós mesmos, aprender a conviver pacificamente com nossos conflitos, aprender a dividir nossas angústias com alguém na busca de caminhos, aprender a lidar com autenticidade, essas são algumas das lições do Espiritismo por dentro. Ardilosos adversários espirituais da nossa causa têm explorado habilmente a fragilidade do “psiquismo místico” de várias criaturas que aderiram aos princípios renovadores da imortalidade. Não conseguindo desanimá-las da freqüência às atividades, optam então por incentivar as celeumas e atenções de amigos queridos com assuntos de exterioridade, insuflando sofismas de toda espécie que formam crenças e crentes em assuntos de menor importância para nossas fileiras, dilatando o grupo daqueles que se tornam oponentes em discussões estéreis que perturbam o clima vibratório dos ambientes. Além disso, é dessas discussões estéreis e precipitadas que costumam surgir as teses que fortalecem o institucionalismo nas práticas e conceitos doutrinários, através do rigorismo que enaltece a pureza por fora, mas que não cogita da pureza por dentro, nos recessos do coração.

Na lista do temas preferidos estão as fórmulas de desenvolvimento das práticas doutrinárias, distraindo-se com opiniões personalistas e que pouco acrescem ao bem das realizações das quais fazem parte. Enquanto se discute sobre questões de fora, esquece-se das questões íntimas, que são mais difíceis de serem tratadas e pensadas quando em um grupo de trabalho. Usa-se ou não luzes coloridas, come-se ou não a carne, bebe-se ou não os alcoólicos, dá-se ou não o passe com olhos fechados, coloca-se ou não uma placa com o nome do centro na via pública, lê-se ou não a obra de tal autor não considerado espírita, coloca-se ou não as garrafas destampadas para fluidificar a água, permite-se ou não a incorporação mediúnica, ora-se ou não de olhos abertos. A lista não pára é interminável.

Outras vezes, a sutil interferência obsessiva opera-se na velha tradição ético-religiosa de estipula padrões de conduta na forma: “espírita faz isso e não pode fazer aquilo”. Assuntos, todos eles, que podem até ser interessantes discutir, mas que têm provocado um movimento de inutilidade e obsessão em razão da forma infantil como são tratados, dando-lhes exagerada importância e priorizando o exterior em detrimento da essência – um reflexo natural dos mecanismos de defesa com os quais grande maioria dos homens encarnados lidam na atualidade.

Seria mais interessante, embora penoso, discutir o que faremos para perdoar um inimigo, como vencer um hábito sexual, como vencer impulsos menos dignos para com alguém, como ser uma criatura agradável onde vivemos, porque nos ofendemos com uma determinada forma de agir, qual a razão de nos irritarmos perante um fato específico, qual a origem de certas fantasias que nos acompanham compulsivamente, porque determinada tarefa é trabalhosa para nós, onde as causas da preguiça para estudar, como se sentir motivado para a leitura edificante, o que podemos fazer para ajudar alguém que todos querem excluir, qual a causados pensamentos de vingança que costumam surgir em nossa tela mental, quais os traumas da infância que ainda nos influenciam na adultidade, o motivo da atração ou rejeição por uma pessoa em particular... São muitas perguntas e incursões das quais, costumeiramente, afastamo-nos. Nisso reside os embriões para a instauração do Espiritismo por dentro!

Deixemos claro a esse respeito que não foram os ritos de fé e nem os sacramentos nas idéias que desviaram a sublime missão da mensagem da Boa Nova, e sim os sentimentos com os quais os homens se trataram mutuamente perante o entendimento de tais caminhos, nas trilhas sombrias da fé exterior. Se os costumes e posturas humanas tivessem sido burilados no caráter nobre e na ação correta criando relações de amor, mesmo com castiçais e velas, missas e igrejismo, conduziríamos a fé aos patamares da maturidade e da elevação espiritual. Contudo, todos os parâmetros e sistemas da ecclésia constituíram graves problemas para a humanidade, porque atrás dos regimes religiosos havia acendrado orgulho sustentando a sede do homem pela supremacia da verdade, assim como hoje existem muitos espíritas repetindo essa malfadada lição...

Sem temor algum, concluímos que ritos e poses em momento algum são os problemas que pesam sobre o futuro espiritual que espera os homens espíritas, mas, acima de tudo, a luz que não souberam ou não quiseram dilatar nos reinos do coração, perante os luminosos raios da Verdade entregue gratuitamente a todos os adeptos, nos seus caminhos de cada dia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário