Os mártires de Lyon
Matéria publicada no Jornal Mundo Espírita - julho/2006
Lyon é denominada a cidade dos mártires. Abundaram ali aqueles que deram a vida por amor à Verdade.
No ano de 177, as perseguições desencadeadas atingiram os cristãos de Lyon e Viena, cidade da França, próxima à primeira. Toda classe de recursos foi utilizada contra os seguidores de Jesus.
Sua presença passou a não ser tolerada em parte alguma, nem nos banhos, nem no foro, nem no mercado. Contra eles se levantaram acusações de que cometiam infanticídios, que se banqueteavam com carne humana, enfim, que praticavam incestos e toda sorte de crimes.
As calúnias, espalhadas entre o povo, o incitaram contra os perseguidos. Cada dia, novas prisões eram feitas. Submetidos a insultos e humilhações, tudo suportavam com admirável resistência.
Conduzidos ao Foro pelo tribuno e soldados, eram interrogados perante o povo, que os apupava, proferindo impropérios.
Vétio Epágato, abnegado senhor, que assistia ao interrogatório, não pôde presenciar tamanha iniqüidade e, cheio de piedade, pediu para sair em defesa dos acusados, comprometendo-se a provar que não mereciam a pecha de criminosos, que lhes era imputada.
Homem de vida austera, desde muito jovem tendo abraçado a Boa Nova, teve recusada sua oferta pelo preposto do Imperador. Tendo-lhe sido perguntado se era cristão e tendo-o afirmado, foi agregado ao número dos demais prisioneiros.
Com ironia, o apontavam, dizendo: "Vejam aí o advogado dos cristãos." Firme na fé, sofreu toda sorte de tormentos.
Santo, diácono de Viena, teve contra si incitada a fúria do povo. Experimentou em seu corpo todos os tormentos que a maldade humana pode engendrar. Quando seus verdugos esperavam fazê-lo confessar algum crime, permaneceu na mesma posição.
A todas as indagações, respondia em latim: "Sou cristão." Não disse seu nome, sua cidade, seu país, se era escravo ou livre, sua raça. Aplicaram-lhe sobre as partes mais sensíveis do corpo, lâminas de bronze ardentes. Ele permaneceu irredutível, como que banhado e fortificado pelas águas de fonte superior.
O corpo em uma chaga só, contraído e retorcido, parecia nem mais conservar a forma humana. Deixaram os verdugos que alguns dias se passassem e depois o tornaram a interrogar.
Acreditavam que, se reiterassem os tormentos sobre as chagas sangrentas e inchadas, alcançariam seu intento, porque o simples tocar de mãos sobre elas produzia dor insuportável.
Se morresse por causa dos tormentos, imaginaram as autoridades que sua morte tão horrível poderia intimidar a outros.
Não alcançaram êxito em nenhuma das opções. O segundo tormento pareceu mais fortalecer a Santo.
Como todas as torturas eram superadas pela constância em Cristo, os prisioneiros foram encerrados em calabouços incômodos, escuros, com os pés presos e o corpo esticado. Muitos pereceram por asfixia. Outros tantos, pelos ferimentos profundos recebidos.
Santo, junto a outros foi levado, finalmente ao suplício entre as feras. Nada parecia aplacar a sanha sanguinária dos que assistiam ao cruel espetáculo. Ao contrário, a perseverança dos mártires lhes aumentou a fúria.
Assim, os que não morriam com as mordidas e patadas das feras, foram amarrados a postes ardentes, desprendendo insuportável odor por todo o anfiteatro.
A Santo não conseguiram arrancar nenhuma outra frase que não a constante: "Sou cristão." Por fim, os que ainda não haviam sucumbido com tantos suplícios, foram degolados.
Blandina, uma escrava de corpo débil, foi atada em um poste, exposta às feras. Aprisionada em forma de cruz, ela orava, fortalecendo os demais e como as feras não a atacassem, foi retirada do madeiro e novamente encarcerada.
No último dia dos espetáculos, a trouxeram para a arena, junto a um jovem de 15 anos, de nome Pontico. Antes os haviam feito assistir aos suplícios de outros, visando arrefecer-lhes o ânimo.
O denodo com que suportaram os tormentos, atraíram a ira do povo para si. Todos se deram conta que era Blandina que insuflava ânimo ao jovem. Finalmente, após vexações e suplícios, ele morreu.
Ela foi arrastada pelas feras, foi pendurada em um poste ardente, foi envolta em uma rede e exposta a um touro bravo, que a lançou repetidas vezes pelos ares. Os soldados se mostravam confusos pela resistência daquela mulher, de corpo tão frágil. Ceifaram-lhe a vida degolando-a.
Os corpos dos que haviam morrido no cárcere foram jogados aos cães e guardados dia e noite para que não pudessem ser recolhidos e sepultados. Os que haviam perecido pelas feras, tiveram seus pedaços também jogados aos cães. Todos ficaram insepultos por seis dias, sob escolta militar.
Eram cabeças truncadas, corpos mutilados, membros carbonizados. Havia quem passasse e os chutasse, rangesse os dentes ou risse, insultando Aquele por quem aqueles "miseráveis" haviam dado a vida.
Passados os seis dias, foram queimados e reduzidos a cinzas aqueles restos, arrojadas posteriormente ao Ródano, para que nada deles sobrasse. Acreditavam assim estar destruindo a semente da Boa Nova. Mal sabiam eles que os cristãos, inflamados de amor, continuariam, por muito tempo ainda, a se oferecerem em holocausto nas arenas do mundo.
Bibliografia:
1. XAVIER, Francisco Cândido. Corações em luta. In:___. Ave, Cristo! Pelo espírito Emmanuel. 3. ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 1966. cap. II.
2. www.cristianismo-primitivo.org/siglo___/MartirLyon.htm
(Actas selectas de los mártires. Sevilha, 1991).
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