Estudando o Espiritismo

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quinta-feira, 21 de abril de 2011

A Providência Divina

A Gênese



A providência é a solicitude de Deus pelas suas criaturas. Deus está em toda parte, tudo vê, a tudo preside, mesmo às menores coisas: é nisto que consiste sua ação providencial. 

"Como é que Deus, tão grande, tão poderoso, tão superior a tudo, pode imiscuir-se em detalhes ínfimos, preocupar-se com os menores atos e com os menores pensamentos de cada indivíduo? Essa é a pergunta que a si mesmo faz o incrédulo, de onde ele conclui que ao admitir a existência de Deus, sua ação não deve estender-se senão às leis gerais do universo; que o universo funciona por toda a eternidade em virtude destas leis às quais cada criatura está submetida em sua esfera de atividade, sem que seja necessário o incessante concurso da Providência." 

21. Em seu estado atual de inferioridade, os homens não podem compreender o Deus infinito, senão com enorme dificuldade, pois que eles mesmos são restritos e limitados e, portanto, eles o consideram restrito e limitado como eles mesmos. A representação que dele fazem é a de um ente circunscrito, e fazem dele uma imagem à sua própria semelhança. Nos quadros que o pintam, sob traços humanos, não contribuem pouco à fomentação deste erro no espírito das massas, que nele adoram mais a forma que o pensamento. No conceito do maior número, é um soberano poderoso, sobre um trono inacessível, perdido na imensidão dos céus, e devido ao fato de que suas faculdades e suas percepções são restritas não compreendem que Deus possa ou ouse intervir diretamente nas pequenas coisas. 

21. Na impotência em que se encontra o homem, de compreender a própria essência da Divindade, não pode fazer dela senão uma idéia aproximativa, com o auxílio de comparações necessariamente muito imperfeitas, mas que pelo menos podem mostrar-lhe a possibilidade daquilo que, à primeira tentativa, lhe parece impossível. 

Suponhamos um fluido bastante sutil para penetrar todos os corpos; este fluido, sendo não inteligente, age mecanicamente, seguindo unicamente as leis materiais; mas se supusermos que este fluido seja dotado de inteligência, de faculdades perceptivas e sensitivas, agirá, não mais cegamente, mas com discernimento, com vontade e liberdade; ele verá, ouvirá e sentirá. 

23. As propriedades do fluido perispiritual podem dar-nos uma idéia. Por si mesmo, não é inteligente, eis que é matéria; mas é o veículo do pensamento, das sensações e das percepções do Espírito. 

O fluido perispiritual não é o pensamento do Espírito, mas sim o agente e o intermediário desse pensamento; como é ele que o transmite, de alguma forma está impregnado pelo pensamento, e dada a impossibilidade em que estamos de o isolar, parece-nos ser íntegro com o ar, de modo que podemos, por assim dizer, materializá-lo. Da mesma forma pela qual dizemos que o ar torna-se sonoro, poderíamos, tomando o efeito pela causa, dizer que o fluido se torna inteligente. 

24. Quer seja assim, ou não, com o pensamento de Deus, isto é, quer ele atue diretamente, ou pelo intermediário de um fluido, para facilidade de nossa inteligência, nós o representamos sob a forma concreta de um fluido inteligente, que enche o universo infinito, penetrando todas as partes da criação: a natureza inteira está imersa no fluido divino; ou, segundo o princípio de que as partes de um todo são da sua mesma natureza, e têm as mesmas propriedades que o todo, cada átomo desse fluido, se assim podemos exprimir-nos, possui o pensamento, isto é, os atributos essenciais da Divindade, e já que tal fluido está em toda a parte, tudo é submetido à sua ação inteligente, à sua previsão, à sua solicitude; não há um ser, ínfimo que o possamos supor, que não seja saturado por ele, de alguma forma. Estamos assim constantemente na presença da Divindade; não há sequer uma de nossas ações que possamos subtrair à sua consideração; nosso pensamento está em incessante contato com seu pensamento, e é com razão que se diz que Deus jaz nas mais profundas dobras de nosso coração. Estamos nele, como ele está em nós, segundo a palavra do Cristo. 

Para estender sua solicitude a todas as suas criaturas, Deus não tem, pois, necessidade de mergulhar seu olhar, do alto de sua imensidade; nossas orações, para serem ouvidas por ele, não têm necessidade de atravessar o espaço, nem serem proferidas com voz ressoante, pois sem cessar a nosso lado, nossos pensamentos repercutem nele. Nossos pensamentos são como os sons de um sino que faz vibrar todas as moléculas do ar ambiente. 

25. Longe de nós o pensamento de materializar a Divindade; a imagem de um fluido universal não é evidentemente senão uma comparação, apenas adequada a dar uma idéia mais justa de Deus, que os quadros que o representam sob uma figura humana; ela tem por objeto fazer compreender a possibilidade de estar Deus em toda parte e de se ocupar de tudo. 

26. Temos incessantemente sob nossos olhos um exemplo que pode dar-nos uma idéia pela qual a ação de Deus pode exercer-se sobre as partes mais íntimas de todos os seres, e por conseguinte, como as impressões mais sutis de nossa alma chegam a ele. Extraímo-la de uma instrução dada por um Espírito, acerca desse assunto. 

27. "O homem é o corpo. Neste universo, o corpo representará uma criação da qual o Espírito seria Deus. (Deveis compreender que aqui não se trata de uma questão de identidade, mas sim de analogia.) Os membros desse corpo, os diversos órgãos que o compõem, seus músculos, seus nervos, suas articulações, são outras tantas individualidades materiais, se assim o podemos dizer, localizadas num recanto especial do corpo; embora seja considerável o número de suas partes constitutivas, tão variadas e tão diversas em sua natureza, entretanto, ninguém duvida que o corpo não pode por si produzir movimentos, assim como uma impressão qualquer não pode ocorrer numa parte qualquer, sem que o Espírito tenha consciência de tal movimento ou de tal impressão. 

Há sensações diversas, simultâneas, em diversos lugares? 

O Espírito as registra todas, distingue-as, atribui a cada uma sua causa e seu lugar de ação, por intermédio do fluido perispiritual. 

"Um fenômeno análogo ocorre entre a criação de Deus. Deus está em toda parte, na Natureza, como o Espírito está em toda parte, no corpo; todos os elementos da criação estão em constante relação com ele, como todas as células do corpo humano estão em contato imediato com o ser espiritual; não há, pois, nenhuma razão para que os fenômenos da mesma ordem não se produzam pela mesma forma, num e noutro caso. 

"Um membro se agita; o Espírito o sente; uma criatura pensa; Deus o sabe. Todos os membros estão em movimento, os diversos órgãos são postos em vibração; o Espírito registra cada manifestação, as distingue e as localiza. As diversas criações, as diferentes criaturas se agitam, pensam, agem de modos diversos e Deus sabe tudo o que se passa, designa a cada um só o que lhe é particular. 

"Igualmente se pode deduzir a solidariedade da matéria e da inteligência, a solidariedade de todos os entes de um mundo entre si, a solidariedade de todos os mundos, e a solidariedade enfim, das criações e do Criador." (Quinemant, Societé de Paris, 1867). 

28. Compreendemos o efeito, já é muito; do efeito remontamos à causa, e avaliamos sua grandeza pela grandeza do efeito; porém sua essência íntima nos escapa, assim como acontece com a causa de uma quantidade de fenômenos. Conhecemos os efeitos da eletricidade, do calor, da luz, da gravitação; chegamos a calculá-los e, entretanto, ignoramos a natureza íntima do princípio que os produz. Será pois, mais racional, negar o princípio divino, porque não o compreendemos? 

29. Nada impede que se admita, pelo princípio de soberana inteligência, um centro de ação, um foco principal que irradia sem cessar, inundando o universo com seus eflúvios, tal como o sol faz com sua luz. Porém, onde está este foco? É o que ninguém pode dizer. É provável que ele não se encontre fixado sobre um ponto determinado, assim como sua ação não é também fixada, e que ele percorra incessantemente as regiões do espaço sem limites. Se simples Espíritos têm o dom da ubiqüidade, esta faculdade, em Deus, deve ser sem limites. Se Deus enche o Universo, poder-se-ia admitir, ainda, a título de hipótese, que tal foco não tem necessidade de se transportar, e que ele se forma sobre todos os pontos onde a soberana vontade julga ser seu propósito ali produzir-se, com o que se poderia dizer que ele está em toda parte, e em parte alguma. 

30. Diante de tais problemas insondáveis, nossa razão deve humilhar-se. Deus existe; disso, não saberíamos duvidar; é infinitamente justo e bom; isso é sua essência; sua solicitude se estende a todos; nós o compreendemos; ele não pode, pois, querer senão o nosso bem, e por isso devemos ter confiança nele; é o essencial; quanto ao mais, procuremos ser dignos de compreendê-lo. 

A Visão de Deus:

31. Já que Deus está em toda parte, por que não o vemos? Será que o veremos quando deixarmos a terra? Tais são as interrogações que diariamente se nos defrontam. 

A primeira, é fácil de ser respondida; nossos órgãos materiais têm percepções limitadas que os tornam impróprios à visão de certas coisas, mesmo materiais. É assim que certos fluidos escapam totalmente à nossa visão e a nossos instrumentos de análise e mesmo assim não duvidamos de sua existência. Vemos os efeitos da peste, e não vemos o fluido que a transporta; vemos os corpos se moverem sob a influência da força da gravitação e não vemos essa força. 

32. As coisas de essência espiritual não podem ser percebidas por órgãos materiais; não é senão pela visão espiritual que podemos ver os Espíritos e as coisas do mundo imaterial; unicamente, pois nossa alma pode ter a percepção de Deus. Ela o vê imediatamente após a morte? É assunto que somente nos pode ser ensinado pelas comunicações de além-túmulo. Por elas, sabemos que a visão de Deus não é privilégio senão das almas mais purificadas, e também que ao deixar o envoltório terrestre, poucas possuem o grau de desmaterialização para isso necessário. Uma comparação vulgar tornará o assunto facilmente compreensível. 

33. Quem estiver no fundo de um vale, imerso numa bruma espessa, não vê o sol; entretanto, pela luz difusa, avalia a presença do sol. Se escala a montanha, à medida que sobe, a névoa se esclarece, a luz torna-se cada vez mais viva, porém ainda ele não vê o sol. Não é senão depois que o observador se elevou completamente acima da camada brumosa, que, ao se encontrar no ar perfeitamente puro, ele o vê em todo o seu esplendor. 

Assim acontece com a alma. O envoltório perispiritual, se bem que seja invisível e impalpável aos nossos sentidos, é para a alma uma verdadeira matéria, ainda demasiado grosseira para certas percepções. Esse envoltório se espiritualiza à medida que a alma se eleva em moralidade. As imperfeições da alma são como camadas brumosas que obscurecem sua visão; cada imperfeição de que ela se desfaz é uma mancha a menos; porém, não é senão depois que ela se haja purificado completamente que goza da plenitude de suas faculdades. 

34. Deus, sendo a essência divina por excelência, não pode ser percebido em todo o seu esplendor, senão pelos Espíritos que hajam alcançado o mais elevado grau de desmaterialização. Se os Espíritos imperfeitos não o vêem, não é que estejam mais afastados dele que os outros; tal como eles, como todos os seres da Natureza, estão mergulhados no fluido divino, como o estamos na luz; apenas, suas imperfeições são como vapores que o furtam à sua visão; quando a névoa se houver dissipado, eles o verão resplandecer; para tal alcançar, não terão necessidade nem de subir, nem de ir buscá-lo nas profundezas do infinito; estando a visão espiritual desembaraçada das membranas morais que a obscurecem, eles o verão em qualquer lugar em que se encontram, mesmo que seja sobre a terra, pois ele está em toda parte. 

35. O Espírito não se purifica senão com vagar e as diversas encarnações são os alambiques em cujo fundo ele deixa, de cada vez, algumas de suas impurezas. Ao deixar seu envoltório corporal, não se despoja instantaneamente de suas imperfeições; é por isso que há muitos que, após a morte, não vêem Deus, tanto quanto não o viam enquanto eram vivos; porém, à medida que se depurem, têm dele uma intuição mais nítida; se eles não o vêem, já o compreendem melhor: a luz é menos difusa. Quando, pois, alguns Espíritos dizem que Deus os proíbe de responder a tal pergunta, não é que Deus lhes apareça, ou lhes dirija a palavra para lhes proibir algo ou para lhes interditar de fazer tal ou qual coisa; porém eles o sentem; recebem os eflúvios de seu pensamento tal como a nós sucede com relação aos Espíritos que nos rodeiam com seus fluidos, embora não os vejamos. 

36. Certo, pois, que nenhum homem pode ver Deus, com os olhos da carne. Se tal favor fosse concedido a alguns, isso não se daria senão num estado de êxtase, no qual a alma estará tão desligada dos laços da matéria quanto possível durante a encarnação. Aliás, um tal privilégio não será concedido senão às almas de eleição, encarnadas em missão e não em expiação. Porém, como os Espíritos da ordem mais elevada resplendem com um brilho deslumbrante, pode ocorrer que Espíritos menos elevados, encarnados ou desencarnados, impressionados com o esplendor que os rodeia, tenham acreditado ver o próprio Deus. O mesmo sucede quando um ministro é considerado em lugar do seu soberano. 

37. Sob qual aparência Deus se apresenta aos que se hajam tornado dignos de tal favor? Será sob uma forma qualquer? Sob uma figura humana, ou como um foco resplandecente de luz? Isso é algo em que a linguagem humana se revela impotente para descrever, porque para nós não existe nenhum ponto de comparação que nos possa dar dele uma idéia; somos como cegos a quem em vão se procuraria fazer compreender o brilho do sol. Nosso vocabulário é limitado às nossas necessidades e ao círculo de nossas idéias; a linguagem dos selvagens não poderia reproduzir as maravilhas da civilização; a dos povos mais civilizados é demasiado pobre para descrever os esplendores dos céus; nossa inteligência é demasiado limitada para os compreender, e nossa visão demasiado fraca seria por eles ofuscada. 

Livraria Allan Kardec Editora

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