Em primeiro lugar, Gerasa, Gadara ou Gergesa? Em Mateus há "Terra dos gadarenos" (que, em 233
A.D. Orígenes - Patrol. Graeca, vol. 14, col. 270/271- corrigiu para gergesenos", apoiado na tradição -
Gên. 10:16 - e nas ruínas locais que ainda encontrou).C. TORRES PASTORINO
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Em Lucas há "Terra dos gerasenos".
Em Marcos há três variantes: Gerasa (Aleph, B,D, antigas versões latinas, Vulgata, versão copta saídica); Gadara (em A, C, pi, sigma, phi, vários manuscritos e versões siríacas: peschitt‚ e filexoniense) e
Gergesa (em L, V, delta, minúsculas do grupo Ferrar: 28, 33, 604, 1071 e versões siríacas: sinaítica,
armênia e etiópica).
Os melhores comentaristas (Tischendorf, Wescott-Hort, Nestle, Hetzenauer, von Soden, Merk, Lagrange, Swete, Jouon, Huby, Pirot, etc) aceitam Gerasa como a melhor lição. Realmente, vejamos rapidamente.
O território de Gadara, na Transjordánia, e sua capital Gadara (cfr. Josefo, Ant. Jud. 17, 11, 4; Bell.
Jud. 2, 6, 3) estava a sudeste do lago, ao sul de Yarmouk; entre Gadara e o Tiberíades corria o rio Hieromax (Scheriat el-Menadireh, que os porcos não podiam atravessar a nado sem afogar-se antes de
chegar ao lago.
A modificação de Orígenes baseia-se na tradição antiga; mas Gergesa ficava na Cisjordânia (margem
ocidental) e os Evangelhos falam claramente na margem oriental (per·n).
A cidade de Gerasa (hoje Djerach) não pode ser a referida, pois dista 30 milhas do lago. Mas no território dessa cidade havia a aldeia de Gamala, (hoje Qala' at el Hosn) e, um pouco ao sul, a 2 km, está o
local Moqa' edlÙ, distante do lago cerca de 30 metros (e há dois mil anos podia ser ainda menor a distância) e com um declive a pique, pois logo a seguir está pequena montanha, cheia de grutas, que bem
podiam ter servido de túmulos. O local parece coincidir com a descrição: a 2 km apenas uma cidade,
(aonde correram para dar notícia do ocorrido) que hoje tem o nome de Koursi (em grego, transcrição
do aramaico, chorsia) que pode ser corruptela de Gerasa. Daí justificar-se, como melhor lição, "no
território de Gerasa" (cfr. Abel, Koursi, no "The Journal of Palestine Oriental Society, 1927, pág. 112 a
121).
A iniciativa da ação pertence ao obsidiado, que Mateus, que tanto aprecia o número par, diz terem sido
dois. Realmente, podiam ter sido dois, embora um fosse o famoso louco violento, e o outro apenas
uma sombra que o acompanhava e, como pessoa apagada, não tenha chamado a atenção, não sendo
computado pelos outros evangelistas.
Marcos, como sempre, apresenta mais pormenores, descrevendo circunstanciadamente, segundo ouvira
da pregação de Pedro, a cena; compraz-se em anotar que ele era tão forte, que até rompia cadeias (nas
mãos) e grilhões (nos pés) e atacava os transeuntes.
Ao vê-lo vir a si, Jesus ordena categoricamente o abandono da presa, chamando-o "espírito nãopurificado" (pneuma ak·tharton), ou seja, inferior, involuído. O obsessor reclama a intervenção, embora reconhecendo, talvez pelo esplendor da aura e pela luminosidade própria, que ali estava um "filho
do Deus Altíssimo" (expressão muito usada pelos israelitas, para distinguir o deus deles, YHWH, dos
outros adorados pelos pagãos). Na realidade, ali estava o próprio YHWH encarnado (cfr. vol. 1). Segundo Marcos, o obsessor a Ele se dirige chamando-O pelo nome. Pergunta, então, que importa aos
dois o sofrimento do obsidiado (quanto ao sentido da pergunta, ver vol. 1). Indaga "por que o atormenta antes do prazo", talvez referindo-se ao resgaste do carma. Mas que saberia o obsessor mais do
que Jesus?
O Mestre pergunta-lhe o nome, ao que o espírito responde "legião", que corresponde ao que hoje chamamos uma falange de espíritos. Não significa essa resposta que eles eram exatamente do mesmo nú-
mero que uma legião do exército romano, como pretendem alguns comentadores; mas apenas, como o
explica o próprio obsessor, então incorporado, "porque somos muitos". O nome, pois, é um símbolo,
que se exagera para valorizar. Tão comum é, por exemplo, ao referirmo-nos a um grupo de pessoas:
"veio um batalh„o para almoçar em nossa casa", e no entanto trata-se de 5 ou 10 pessoas.
Ainda segundo Marcos, o obsessor pede que não seja mandada a falange para fora do "território", e,
segundo Lucas, que não a mande "para o abismo". E solicita lhes dê autorização para "passar" para
uma vara de porcos que fossava na encosta do morro. Há suposições várias manifestadas pelos comentaristas, sempre do ponto de vista teológico-romano. Parece-nos todavia, que para aqueles queSABEDORIA DO EVANGELHO
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lidam praticamente com os fenômenos obsessivos e conhecem os trabalhos espiritistas, a explicação
não é difícil. Essas falanges de espíritos inferiores, involuídos, sobretudo os que habitam os cemitérios
(como é expressamente o caso desse obsidiado) dedicam-se ao vampirismo, sugando a vitalidade da
vítima. Ora, sabiam eles que jamais lhes seria permitido por Jesus que passassem para outras criaturas
humanas, e encontram uma oportunidade na vara de porcos (que Marcos diz ser constituída de 2.000
animais) e solicitam insistentemente que lhes permita continuar o vampirismo pelo menos nos porcos.
A expressão "entrar neles" de Marcos pode ser efeito da ignorância desses fenômenos por parte do
obsessor, coisa que ainda hoje persiste inclusive nos meios espíritas, quando se fala em "incorpora-
ção", dando quase a idéia de que o espírito "entra no corpo do médium". E muito médium julga que é
isso mesmo que se dá ... Em Mateus e Lucas aparece uma palavra melhor: "passar para", que exprime
uma transferência de operação vampiresca.
A expressão "sair do território" talvez exprimisse uma facilidade maior de encontrar presas entre os
pagãos, do que entre os israelitas; ou talvez "território" fosse apenas um eufemismo para designar o
corpo do obsidiado, por eles explorado. Quando pedem que os não mande "para o abismo", referem-se
à zona de trevas em baixo do umbral, onde sofreriam horrores sem o alimento da vitalidade a que estavam habituados. O com que não contavam, era com o desfecho, causado pelo pânico da invasão de
entidades grosseiras e muito materializadas nos animais, fazendo-os despenhar-se ladeira abaixo em
desabalada carreira, tão violenta que não conseguiram parar, e caíram no lago, afogando-se.
Pergunta-se a razão de ser de tantos porcos, animal considerado "impuro" e proibido entre os israelitas.
Entretanto, estamos em território não-judeu, onde o comércio de carne suína devia ser bastante rendoso.
Também se pergunte se a permissão dada por Jesus, com o consequente afogamento dos porcos, não
constituiu uma "perversidade" contra os pobres animais, que nada tinham que ver com o caso. Em
primeiro lugar, como podemos ignorantes ainda, querer julgar atos que fogem à nossa alçada? Além
disso, um bem maior pode justificar, por vezes, um mal menor, sobretudo se é obtido um bem espiritual através de uma perda material. A maioria dos homens acha normal e natural que se mate e coma
um porco apenas para satisfação do paladar, mas se insurge contra a morte do animal para libertar um
obsidiado ... Além do mais, consideremos que apenas ocorreu aos porcos uma destruição do corpo
físico, fenômeno que teria fatalmente que ocorrer mais dia menos dia, e nada mais, pois seus princípios
vitais (nephesh) voltariam a reencarnar logo de imediato. Supõem, ainda, alguns comentaristas que se
teria tratado de uma "lição" aos proprietários, já que, sendo um comércio ilícito o da carne de porco,
não era sequer lícito criá-los com esse intuito. Realmente assim seria se se tratasse de criadores israelitas, mas não podemos saber se era essa a realidade. O fato é que os evangelistas não se preocuparam
em justificar o modo de agir de Jesus.
Pergunta-se por que os porcos "se suicidaram", ou por que a falange se precipitou no lago. De fato, não
ocorreu nem uma coisa nem outra: simplesmente os porcos, ao se sentirem atacados de inopino (e os
animais possuem percepção do astral inferior, que é o plano deles) entraram em pânico e correram para
fugir. Evidentemente, o caminho mais fácil é a descida, e não a subida. O próprio impulso da fuga levou-os a descer automaticamente, às carreiras. Também os obsessores não deviam ter imaginado esse
fim, decepcionante sobretudo para eles.
A observação que se nos apresenta de imediato é que Jesus não se preocupou em "doutrinar" essa falange (como aliás nenhum dos outros obsessores que foram por Ele afastados), quer porque entidades
do plano astral se encarregavam disso, quer porque eram eles tão involuídos ainda, que não adiantava
doutrinação, mas apenas se devia aguardar um pouco mais de evolução para que pudessem compreender a necessidade de corrigir-se.
Os obsessores deste caso estavam naquele estágio em que se satisfazer com modificação de situações
materiais, para abandonar sua presa. Esse processo de oferecer coisas materiais para conseguir a libertação do obsidiado usado neste caso por Jesus, é ainda hoje bastante usual nos terreiros de Umbanda.
Após o acontecimento, trágico para os guarda-porcos responsáveis pela vara, estes correm à cidade,
que ficava a cerca de 2 km, para contar aos proprietário o que havia ocorrido sem culpa deles. Os mo-C. TORRES PASTORINO
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radores se alvoroçaram e a notícia corria célere, não muito acreditada, até que, por proposta de um
mais incrédulo, a massa se movimentou para fora da cidade, chegando em cerca de vinte minutos ao
local em que se achava Jesus com seus discípulos. Os cadáveres dos suínos juncavam a praia do lago,
alguns ainda nas contrações finais e, sentado aos pés de Jesus, vestido, risonho, feliz, perfeito em seu
juízo, aquele homem que tanto pânico vivia a causar na região e que por todos era muito bem conhecido. A prova da veracidade da narrativa dos guarda-porcos evidenciava-se, tudo coincidia plenamente.
Mas, enquanto o louco apenas se limitava a assustar os transeuntes ou a atacar os incautos que se
aventuravam naquelas regiões, a cura dele lhes causara sérios prejuízos, destruindo-lhes a riqueza. Havia curado um homem, o que nenhum lucro lhes trazia, mas doutro lado lhes matara a enorme vara de
porcos, o que representava substancial perda econômica. Não havia alternativa: melhor o homem, embora louco, do que Jesus. Então, afoitamente vão a Ele e pedem que se vá dali, que "se afaste do território deles" - o que representava o pedido oposto ao que lhe fizera o obsessor: que Ele não o afastasse
daquele território. Os habitantes da região concordavam com o obsessor, com ele sintonizavam, preferiam-no: como se libertariam dele?
Jesus nada retruca, não se defende, não protesta, não argumenta, não procura demonstrar os benefícios
que proviriam de Sua permanência alguns dias entre eles, por levar-lhes saúde física e espiritual: calado, volta-se para reembarcar, e entra no barco.
Ao verificar que seu benfeitor vai partir, o ex-obsidiado - talvez chocada por vê-Lo a3sim maltratado e
enxotado - resolve solicitar-Lhe um lugar de discípulo, para acompanhá-Lo sempre. Sem dar os motivos, Jesus recusa mantê-lo a Seu lado, mas nem por isso deixa de confiar-lhe tarefa de alta responsabilidade: a pregação, sobretudo pelo exemplo, do que recebera da Divindade. Humildemente o exobsidiado aceita a tarefa, e os evangelistas testam que realmente ele passou a perlustrar a região da
Decápole, falando dos maravilhosos poderes de Jesus.
Do fato material podemos deduzir interessante liÁ„o: a da dificuldade que encontram os "filhos do
homem" ao "chegar ‡ outra margem" (‡ Terra), onde deparam espÌritos humanos na loucura da delinquÍncia, preferindo os porcos ao Cristo e suplicando que Este se afaste deles, para que n„o sofram
os prejuÌzos materiais da perda dos porcos.
A atuaÁ„o È descrita com pormenores. A humanidade atrasada n„o consegue tranquilizar-se nem ter
paz, embora se tente disciplin·-la: rompe todos os laÁos e sÛ se compraz "entre os t˙mulos", junto ‡s
criaturas cadaverizadas no mal e no materialismo mais grosseiro. Ao deparar com um Mission·rio do
Plano Superior, n„o compreendem o benefÌcio que possam usufruir e ainda pedem satisfaÁıes: "que te
importa nosso estado"? Rebeldes atÈ o fim, n„o aceitam nenhum jugo, quebrando todos os grilhıes
que pretendam disciplin·-los e elev·-los. N„o se trata de um sÛ indivÌduo, tomado como sÌmbolo, mas
de uma îlegi„o", da maioria, da massa involuÌda ainda.
N„o obstante, levado pela forÁa sobre-humana do Manifestante Divino, prostra-se a Seus pÈs, e recebe ordem taxativa de evoluir: "EspÌrito inferior (tÛ pneuma tÛ ak·tharton, com o artigo definido antes
do substantivo e repetido antes do adjetivo, isto È, "espÌrito n„o-purificado" ou seja, "que n„o fez sua
catarse"), sai desse homem", para dar lugar ao "homem novo". A ordem do Mestre era dirigida ao
"espÌrito" (‡ personalidade) ainda atrasado, para que "se afastasse", deixando que o EspÌrito (a individualidade) assumisse o comando. Mas a rebeldia dos atrasados È enorme, por causa da ignor‚ncia:
pedem que "n„o os atormente" e preferem continuar a rebolcar-se entre os suÌnos, a subir um degrau
evolutivo, abandonando os vÌcios. Ent„o o Avatar deixa-os ‡ prÛpria sorte, n„o os forÁa, e espera atÈ
que tenham capacidade para compreender a necessidade de progredir, saindo da lama dos chiqueiros
(n„o vemos, ainda hoje, populaÁıes miser·veis que recusam sair das favelas, dos mocambos, dos
"alagados", para habitar em conjuntos residenciais limpos? N„o se trata de carma, mas de involuÁ„o;
eles se comprazem na sujeira em que vivem; e mesmo quando s„o transportados ‡ forÁa, levam consigo sua sujeira, e em menos de um mÍs o pequeno apartamento novo j· se tornou a mesma pocilga em
que estavam habituados a viver). Acontece que eles "solicitam com insistÍncia" que os mande para os
porcos e isso lhes È permitido. Eles v„o. E o resultado n„o se faz esperar: quem quer permanecer noSABEDORIA DO EVANGELHO
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por„o da humanidade, comprazendo-se na animalidade que j· deveria ter sido superada, sÛ pode ter o
destino de "afogar-se", j· que a descida pelo declive dos vÌcios È f·cil, mas leva ‡ morte.
No entanto, alguns se dispıem a realizar a faÁanha, e a primeira vantagem que experimentam È a
conquista da liberaÁ„o com a paz consequente. LÛgico que, ao sentir-se liberado das terrÌveis forÁas
negativas, seu primeiro impulso, ampliado pelo sentimento de gratid„o, È ligar-se ao Avatar, dedicando-se totalmente a Seu serviÁo. Mas apesar da boa-vontade e das boas-intenÁıes, ele n„o se acha maduro para esse passo: È ent„o aconselhado a realizar seu apostolado entre os de sua evoluÁ„o (seus
parentes e conterr‚neos), e para isso existem tantas seitas e religiıes, tantos sistemas de espiritualismo que exatamente servem para conservar em seus ambientes aqueles que j· desejam progredir, mas
que n„o podem dar saltos, por falta de vivÍncia anterior. Nesses agrupamentos, v„o eles plasmando as
experiÍncias necess·rias, atÈ que um dia possam alÁar vÙo.
Vem a seguir a reaÁ„o daqueles que assistem ao fenÙmeno. Ao verificarem a transformaÁ„o das personalidades (que eles conheciam desequilibradas nos vÌcios) tornando-se pacÌficas e ordeiras, eles
"tÍm medo"! ... Medo dos bons! Medo dos calmos! Eles que o n„o tinham dos viciados, porque lhes
eram iguais. E chegam ‡ conclus„o de que tal mudanÁa n„o lhes È ˙til nem vantajosa: mil vezes melhor permanecer no materialismo grosseiro e animal! Resolvem, ent„o, solicitar ao Mensageiro "que
se retire deles", que abandone o planeta visitado. O exemplo de Jesus, nessa circunst‚ncia, foi atÈ
suave pois, na realidade, eles n„o costumam "pedir" que se afaste: eles o expulsam, quase sempre de
modo rude e violento (decapitaÁ„o, enforcamento, fogueira, crucificaÁ„o, etc.).
Nesta compreens„o mais lÛgica e profunda, fica totalmente explicado que n„o se trata em absoluto de
"espÌritos" desencarnados que "incorporem" em porcos, nem tampouco de castigo para os pobres
animais. Se o fato se realizou, como È relatado e possÌvel, foi apenas para que dele pudÈssemos extrair
uma liÁ„o preciosa e oportuna para nossa prÛpria evoluÁ„o.
Em todos os atos e palavras, os Manifestantes Divinos trazem ensinamentos que s„o apreendidos e
vividos por aqueles que os conseguem compreender: "quem tem ouvidos, ouÁa". . "quem puder compreender, compreenda ...
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