Estudando o Espiritismo

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sexta-feira, 17 de junho de 2016

O Espiritismo e o Cólera

O Espiritismo e o Cólera


Sabe-se de que acusações os primeiros cristãos eram cumulados em Roma; não havia crime do qual não fossem capazes, de infelicidades públicas das quais, no dizer de seus inimigos, não fossem os autores voluntários ou a causa involuntária, porque sua influência era perniciosa. Em alguns séculos daqui ter-se-á dificuldade em crer que os espíritos fortes do século dezenove hajam tentado ressuscitar essas ideias a respeito dos Espíritas, declarando-os autores de todas as perturbações da sociedade, comparando sua doutrina à peste, e convidando a persegui-los. Esta é da história impressa; estas palavras saíram de mais de um púlpito evangélico; mas o que é mais surpreendente, é que se as encontra nos jornais que dizem falar em nome da razão, e se colocam como campeões de todas as liberdades, e da liberdade de consciência em particular. Já possuímos uma coleção curiosa de amenidades desse gênero que nos propomos reunir mais tarde em volume para maior glória de seus autores, e a edificação da posteridade.
Seremos, pois, reconhecidos àqueles que gostarem de nos ajudar a enriquecer essa coleção nos enviando tudo o que, de seu conhecimento, apareceu ou aparecerá sobre esse assunto. Comparando esses documentos da história do Espiritismo com os da história dos primeiros séculos da Igreja, ficar-se-á surpreso em ali encontrar pensamentos e expressões idênticas; não lhe falta senão uma coisa: as bestas ferozes do circo, o que no entanto é um progresso.
O Espiritismo sendo, pois, uma peste eminentemente contagiosa, uma vez que, da confissão de seus adversários, ele invade com uma assustadora rapidez todas as classes da sociedade, ele tem uma certa analogia com o cólera; também neste último levante geral, certos críticos acintosamente chamaram o Spirito-morbus, e não haveria nada de surpreendente em que se o acusasse de ter importado esse flagelo; porque há a se anotar que dois campos diametralmente opostos se dão a mão para combatê-lo. Num, nos asseguraram, faz-se bater uma medalha com efígie de santo Benoít que basta carregar para se preservar do contágio espírita; disse que esse meio cura aqueles que por eles foram atingidos.
Há realmente uma analogia entre o Espiritismo e o cólera, é o medo que um e o outro causam a certas pessoas; mas consideremos a coisa dum ponto de vista mais sério; eis o que se nos escreve de Constantinopla:
“…Os jornais informaram o rigor com o qual o terrível flagelo vem de maltratar em nossa cidade e vizinhanças, tudo em atenuando suas devastações. Algumas pessoas, dizendo-se bem informadas, dão o número de coléricos falecidos em 70 mil, e outros em quase cem mil. Sempre é que fomos rudemente experimentados, e podeis vos figurar as dores e a tristeza geral de nossas populações. É sobretudo nesses tristes momentos de epidemia assustadora que a fé e a crença espíritas dão a coragem; acabamos de ter disso a mais verídica prova. Quem sabe se não devemos a essa calma da alma a essa persuasão da imortalidade, a essa certeza de existências sucessivas onde os seres são recompensados segundo seu mérito e seu grau de adiantamento; quem sabe, digo eu, se não é a essas crenças, bases de nossa bela Doutrina, que todos nós, Espíritas de Constantinopla, que somos, como o sabeis, bastante numerosos, devemos ter sido preservados do flagelo que passeou, e passeia ainda ao nosso redor! Digo isto tanto mais quanto foi constatado, aqui como alhures, que o medo é a predisposição mais perigosa do cólera, como a ignorância dele torna infelizmente a fonte contagiosa…
“Repôs Júnior, advogado.”

Seguramente, seria absurdo crer que a fé espírita seja um certificado de garantia contra o cólera; mas como está cientificamente reconhecido que o medo, enfraquecendo ao mesmo tempo o moral e o físico, torna mais impressionável e mais suscetível de receber os ataques das moléstias contagiosas, é evidente que toda causa tendente a fortalecer o moral é um preservativo. Isto compreende-se tão bem hoje que se evita, tanto quanto possível seja nos relatórios, seja mas disposições materiais, o que pode ferir a imaginação por um aspecto lúgubre.
Os Espíritas podem, sem dúvida, morrer do cólera como todo o mundo, porque seu corpo não é mais imortal do que o dos outros, e que, quando a hora é chegada, é preciso partir, que isso seja por essa causa ou por uma outra; o cólera é uma dessas causas que não têm de particular senão levar um maior número de pessoas ao mesmo tempo, o que produz mais sensação; partem-se em massas, em lugar de partir por partes, eis toda a diferença. Mas a certeza que têm do futuro, e, sobretudo, do conhecimento que têm desse futuro, que responde a todas as suas aspirações e satisfaz a razão, fazem com que não lamente de nenhum modo a Terra onde se consideram como transitoriamente em exílio. Ao passo que, em presença da morte, o incrédulo não vê senão o nada, ou se pergunta o que vai ser dele com ela, o Espírita SABE que, se morre, não será senão despojado de um envoltório material sujeito aos sofrimentos e às vicissitudes da vida, mas que será sempre ele com um corpo etéreo inacessível à dor; que gozará de percepções novas e de faculdades maiores; que vai reencontrar aqueles a quem amou e que o esperam no limiar da verdadeira vida, da vida imperecível. Quanto aos bens materiais, sabe que deles não terá mais necessidade e que os gozos que eles proporcionam serão substituídos por gozos mais puros e mais invejáveis, e que não deixam depois deles nem amarguras nem remorsos. Abandona-os, pois, sem pena e com alegria, e lamenta aqueles que, ficando depois dele sobre a Terra, vão ainda deles ter necessidade. É como aquele que, tornando-se rico, deixa suas roupas velhas aos infelizes. Também diz aos seus amigos, deixando-os: não me lamenteis; não choreis minha morte; felicitai-me antes por ter sido libertado do cuidado da vida, e por entrar num mundo radioso onde vou vos esperar.
Quem tiver lido e meditado nossa obra O Céu e o Inferno Segundo o Espiritismo, e sobretudo o capítulo sobre as apreensões da morte, compreenderá a força moral que os Espíritas haurem em suas crenças, em presença do flagelo que dizima as populações.
Disto se segue que vão negligenciar as precauções necessárias em semelhante caso, e negligenciar no perigo? De nenhum modo: tomam todas aquelas que mandam a prudência e uma higiene racional, porque não são fatalistas, e que, se não temem a morte, sabem que não devem procurá-la. Ora, negligenciar as medidas sanitárias que podem preservá-las seria um verdadeiro suicídio do qual conhecem muito bem as consequências para a ele se expor. Consideram como um dever velar pela saúde do corpo, porque a saúde é necessária para o cumprimento dos deveres sociais. Se procuram prolongar a vida corpórea, isto não é pelo apego à Terra, mas afim deter mais tempo para progredir, se melhorar, depurar-se, despojar o velho homem e adquirir uma maior soma de méritos para a vida espiritual. Mas se, apesar de todos os cuidados, eles devem sucumbir, disto tomam sua parte sem se lamentar, sabendo que todo progresso leva seus frutos, que nada daquilo que se adquire em moralidade e em inteligência está perdido, e que se não têm demérito aos olhos de Deus, estarão sempre melhor no outro mundo que neste, quando não tenham mesmo o primeiro lugar; dizem a si mesmos simplesmente: Iremos um pouco mais cedo onde teríamos ido um pouco mais tarde.
Crer-se que com tais pensamentos não se esteja nas melhores condições de tranquilidade de espírito recomendadas pela ciência? Para o incrédulo ou o incerto, a morte tem todos seus terrores, porque perde tudo e não espera nada. Que pode dizer um médico materialista para acalmar nos enfermos o medo de morrer? Nada senão aquilo que disse um dia um deles a um pobre diabo que tremia unicamente ao ouvir o nome do cólera: “Bah! enquanto não se está morto há esperança; depois, em definitivo, não se morre senão uma vez, e está logo passado; quando se está morto, tudo acabou; não se sofre mais.” Tudo acabou quando se está morto, eis a suprema consolação que ele dá.
O médico espírita, ao contrário, diz àquele que vê a morte diante de si:
“Meu amigo,
Vou empregar todos os recursos da ciência para vos restituir a saúde e vos conservar pelo maior tempo possível; triunfaremos, disto tenho esperança; mas a vida do homem está nas mãos de Deus, que nos chama quando nosso tempo de prova neste mundo terminou; se a hora de vossa libertação chegou, regozijai-vos, como o prisioneiro que vai sair de sua prisão. A morte nos livra do corpo que nos faz sofrer, e nos devolve à verdadeira vida, vida isenta de perturbações e de misérias. Se devereis partir, não penseis que estareis perdido para vossos parentes e vossos amigos que ficam depois de vós; não, com isto não estareis menos no meio deles; vê-lo-eis e os ouvireis melhor do que não podeis fazê-lo neste momento; vos os aconselhareis, dirigi-los-eis e inspirá-los-eis para o bem. Se, pois, apraz a Deus vos chamar a ele, agradecei-lhe por vos restituir a liberdade; se prolonga vossa permanência aqui agradecei-lhe ainda por vos dar o tempo para terminar vossa tarefa. Na incerteza, submetei-vos sem murmúrio à sua santa vontade.
Tais palavras não são próprias para trazer a serenidade a alma, e esta serenidade não secunda a eficácia dos remédios, ao passo que a perspectiva do nada mergulha o moribundo na ansiedade do desespero?
Além dessa influência moral, o Espiritismo tem uma mais material. Sabe-se que os excessos de todos os gêneros são uma das causas que mais predispõem aos ataques da epidemia predominante; também os médicos recomendam a sobriedade em todas as coisas, prescrição salutar, à qual muita gente tem dificuldade de se submeter. Admitindo que o façam, sem dúvida, é um ponto importante, mas crê-se que uma abstenção momentânea possa reparar instantaneamente as desordens orgânicas causadas pelos abusos inveterados, degenerados em hábito, que usaram o corpo e, por isto mesmo, tornaram-no acessível aos miasmas deletérios? Fora do cólera, não se sabe o quanto o hábito da intemperança é pernicioso nos climas tórridos, e naqueles onde a febre amarela é endêmica? Pois bem! o Espírita, em consequência de suas crenças e da maneira que encara o objetivo da vida presente e o resultado da vida futura, modifica profundamente seus hábitos; em lugar de viver para comer, come para viver; não faz nenhum excesso; não vive como cenobita: também usa de tudo, mas não abusa de nada. Deve estar aí seguramente uma consideração preponderante a acrescentar àquela que faz valer nosso correspondente de Constantinopla.
Eis, pois, um dos resultados desta Doutrina, à qual a incredulidade lança a injúria e o sarcasmo; que ela a abafe, tache de loucura, e que, segundo ela, traz a perturbação na sociedade. Guardai vossa incredulidade, se ela vos apraz, mas respeitai uma crença que torna felizes e melhores aqueles que a possuem. Se for uma loucura crer que tudo não acaba para nós com a vida, que depois da morte vivemos uma vida melhor, isenta de cuidados; que retornaremos ao meio daqueles que amamos; ou ainda crer que depois da morte não estamos nem mergulhados nas chamas eternas, sem esperança de delas sair, o que não valeria mais do que o nada, nem perdido na ociosa e beata contemplação do infinito, apraza a Deus que todos os homens fossem loucos desta maneira; haveria entre eles menos crimes e suicídios.
Numerosas comunicações foram dadas sobre o cólera; várias o foram na Sociedade de Paris ou em nosso círculo íntimo; delas não reproduziremos senão duas, fundidas numa única, para evitar as repetições, e que resumem o pensamento dominante na maioria.
(Sociedade de Paris. – Médium, Srs. Desliens e Morin.)
Uma vez que o cólera é uma questão de atualidade, e que cada um traz seu remédio para repelir o terrível flagelo, permitir-me-ei, se o consentirdes, dar igualmente minha opinião, se bem que me pareça pouco provável que tendes a temer-lhe os ataques de maneira cruel. No entanto, como é bom que, se possível, os meios não faltem, coloco minha pouca luz à vossa disposição.
Essa afecção, o que quer que dela se diga, não é imediatamente contagiosa, e aqueles que se encontram em um lugar onde ela grassa não devem temer em dar seus cuidados aos enfermos.
Não existe remédio universal contra essa moléstia, seja preventivo, seja curativo, tendo em vista que o mal se complica com uma multidão de circunstâncias que resistem, seja ao temperamento dos indivíduos, seja ao seu estado moral e aos seus hábitos, seja às condições climatéricas, o que faz que tal remédio triunfe em certos casos e não em outros. Pode-se dizer que em cada período de invasão e segundo as localidades, o mal deve ser o objeto de um estudo especial, e requer uma medicação diferente. É assim que, por exemplo, o gelo, a triaga, etc., puderam curar casos numerosos nos cóleras de 1832, de 1849, e em certas regiões poderiam não dar senão resultados negativos em outras épocas e em outros países. Há, pois, uma multidão de remédios bons, e nenhum que seja específico. Foi essa adversidade nos resultados que confundiu e confundirá por muito tempo ainda a ciência, e que faz com que nós mesmos não possamos dar remédio aplicável a todo o mundo, porque a natureza do mal não o comporta. No entanto, há regras gerais, fruto da observação, e das quais importa não se afastar.
O melhor preservativo consiste nas precauções de higiene sabiamente recomendadas por todas as instruções dadas para esse efeito; são acima de tudo o asseio, o distanciamento de toda causa de insalubridade e dos focos de infecção, a abstenção de todo excesso.
Com isto é preciso evitar de mudar seus hábitos alimentares, se isso não for para suprimir as coisas debilitantes. É preciso igual mente evitar os resfriamentos, as transições bruscas de temperatura, e abster-se, a menos de necessidade absoluta, de toda medicação violenta, podendo trazer uma perturbação na economia.
O medo, como o sabeis, frequentemente, em semelhante caso, é pior do que o mal; o sangue-frio não se impõe, infelizmente, mas vós, Espíritas, não tendes necessidade de nenhum conselho sobre este ponto; olhais a morte impassíveis, e com a calma que dá a fé.
Em caso de ataque, importa não negligenciar os primeiros sintomas. O calor, a dieta, uma transpiração abundante, as fricções, a água de arroz na qual se pôs algumas gotas de láudano, são medicamentos de pouco custo e cuja ação é muito eficaz, se a energia moral e o sangue-frio vêm se juntar a eles. Como é frequentemente difícil se proporcionar o láudano na ausência de um médico, pode-se a isto suprir, em caso de urgência por outra composição calmante, e em particular pelo suco de alface, mas empregado em dose fraca. Aliás, pode-se ferver simplesmente algumas folhas de alface na água de arroz.
A confiança em si e em Deus é, em semelhante circunstância, o primeiro elemento da saúde.
Agora, que a vossa saúde material está posta ao abrigo do perigo, permiti-me ocupar-me de vosso temperamento espiritual, ao qual uma epidemia de um outro gênero parece querer atacar. Não temais nada deste lado; o mal não poderia atingir senão os seres a quem a vida verdadeiramente espiritual faz falta, e já mortos sobre o tronco. Todos aqueles que se sentem votados, sem retorno e sem pensamento dissimulado, à Doutrina nela haurirão, ao contrário, novas forças, para fazer frutificar os ensinamentos que nos fazemos um dever vos transmitir. A perseguição, qualquer que ela seja, é sempre útil; ela põe à luz os corações sólidos, e se ela destaca do tronco principal, alguns galhos mal presos, os jovens rebentos, amadurecidos pelas lutas nas quais, em seguindo nossos conselhos, se tornarão homens sérios e refletidos. Assim, pois, boa coragem; caminhai sem medo no caminho que vos está traçado e contai com aquele que não vos fará jamais falta na medida de suas forças.
Doutor DEMEURE.

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